ARTIGO

Transformar tragédias em vida saudável

Transformar tragédias em vida saudável

Por Dom Reginaldo Andrietta, Bispo Diocesano de Jales

Por Dom Reginaldo Andrietta, Bispo Diocesano de Jales

Publicada há 4 anos

É triste receber notícia de morte. Pior ainda quando ocorre por acidente de trabalho, sobretudo de uma pessoa da família ou amiga. Em 1980, perdi um irmão com 25 anos, assim. Ele deixou esposa de 20 anos e um filho de um ano. Conheço essa dor. Quantos passam por esse sofrimento! Acidentes, no entanto, podem ser evitados.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), com sede em Genebra, na Suíça, que congrega representantes de estados nacionais, empresários e trabalhadores de todo o mundo, contabiliza 2,3 milhões de mortes, mundialmente, por ano, causadas por acidentes de trabalho. Esses acidentes matam mais do que grandes guerras.

Fernando Maciel, da Advocacia Geral da União, afirmou em audiência pública do Senado, em 2018, que, “se alguém quiser matar seres humanos não precisa desenvolver arma química, basta abrir uma empresa e não dar saúde e segurança porque os números da OIT mostram a carnificina que é a realidade do trabalhador sujeito a essas condições".

Juliana Oitaven, do Ministério Público do Trabalho, assinalou nessa audiência que, no Brasil, "de 2012 a 2017 houve 14.412 mortes acidentárias notificadas e 3,8 milhões de acidentes de trabalho, e em razão deles houve um gasto de 26 bilhões de reais somente com benefícios acidentários". A família sofre e a sociedade também se penaliza.

Acidentes ocorrem em todas as categorias profissionais. Até mesmo trabalhadores hospitalares estão sofrendo consequências graves pelas jornadas longas e as condições insalubres e inseguras de trabalho. Esse segmento, coincidentemente, é o que vem fazendo uso da jornada 12 por 36. O cansaço excessivo gera grandes riscos.

28 de abril é o Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho. Nessa data, em 2018, o Fórum Nacional das Centrais Sindicais sobre a Saúde do Trabalhador, denunciou a tragédia brasileira dos acidentes de trabalho que resultaram em mortes ou mutilações, que seria considerada mais trágica ainda, se todos fossem notificados.

Essa denúncia tende a ser mais forte este ano pois a reforma trabalhista favoreceu o trabalho informal e a terceirização irrestrita, precarizando ainda mais as condições de trabalho. Segundo Victor Pagani, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, a cada 10 vítimas de acidente, oito são trabalhadores terceirizados.

No 1º de Maio, Dia Internacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras, não podemos esquecer dessa tragédia mundial a ser superada pela conquista de trabalho em condições saudáveis. Nessa ocasião, será oportuno analisarmos a aplicação da Convenção 155 da OIT, ratificada pelo Estado Brasileiro, sobre a segurança e a saúde dos trabalhadores.

A Igreja no Brasil é consciente da importância de sua missão frente a esse problema, realizando-a sobretudo por meio de pastorais e movimentos que atuam no mundo do trabalho urbano e rural. Cabe-lhe, no entanto, ser mais eficiente e eficaz nessa missão, inserindo-a mais claramente nas diretrizes de sua ação evangelizadora de 2019 a 2023.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil prepara essas diretrizes focando-se no mundo urbano, Galileia de hoje, onde reencontramos Cristo (cf. Mt 28,10), sobretudo na realidade dos trabalhadores e trabalhadoras, desde a qual temos o desafio de transformar as tragédias do desemprego, do trabalho precário e dos acidentes de trabalho, em vida saudável. 

Jales, 23 de abril de 2019.

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