ARTIGO

Uma prova de fé

Uma prova de fé

Por Amaury César Soares

Por Amaury César Soares

Publicada há 4 anos

Eric Henry Liddell nasceu em Tianjin, na China, no dia 16 de janeiro de 1902. Era filho de missionários presbiterianos escoceses que exerciam a atividade pastoral naquele país. Ainda na infância, foi enviado a Londres para estudar, enquanto seus pais continuaram o trabalho religioso na China. Na Universidade, apaixonou-se pelo atletismo, tornando-se um grande corredor.

Em 1924, Liddell foi selecionado para competir pela equipe da Grã-Bretanha nos Jogos Olímpicos de Paris. Iria participar de duas provas: 100 e 200 metros. Entretanto, a eliminatória da prova dos 100 metros foi marcada para um domingo, dia considerado sagrado pela sua religião. Apesar do enorme desejo de participar da prova (para a qual havia se preparado por vários anos), apesar da incrível pressão que recebeu das autoridades britânicas, Liddell recusou-se a competir no domingo. Segundo suas palavras, Deus estava em primeiro lugar. A sua fé vinha antes do seu dever para com a pátria.

Diante da posição irredutível de Liddell, a equipe britânica decidiu inscrevê-lo na prova dos 400 metros, cuja eliminatória ocorreria em outro dia. Ele aceitou participar. Ao final da competição, Liddell venceu a prova dos 400 metros, com o tempo de 47,6 segundos, batendo o recorde mundial então vigente. Ele disputou ainda a prova dos 200 metros, ficando em 3º lugar.

A repercussão dos eventos ocorridos nos Jogos Olímpicos de 1924 transformaram Liddell em uma lenda. Não tanto pelo seu feito esportivo, mas principalmente pela sua demonstração de fé. A história da participação britânica naquela competição foi retratada no filme “Carruagens de Fogo”, vencedor do “Oscar” de 1981. Todos que tiverem a curiosidade de conhecer mais detalhes a respeito da vida de Eric Liddell vão descobrir fatos até mais edificantes que o relatado acima. Ele foi verdadeiramente um ser humano excepcional.

Eu não tenho a mesma fé de Eric Liddell, não tenho as mesmas convicções que ele tinha. Para mim, a única coisa que Deus realmente espera de todos nós é que amemos o nosso semelhante. Esta foi a lição que Jesus Cristo nos deixou: “Amai o teu próximo como a ti mesmo”. Ensinamento simples, mas difícil de realizar. Amar não é um ato de vontade: amamos (ou não) independentemente do nosso desejo. Alguns indivíduos gostariam de amar determinadas pessoas, mas não conseguem; outros gostariam de deixar de amar alguém em especial, mas também não conseguem. É fácil amar as pessoas boas, justas, os nossos pais, os nossos filhos. Mas amar todos os seres humanos é muito difícil. Como podemos amar os maus, os assassinos, os estupradores, os violentos?

Não acredito que seja importante para Deus que as pessoas guardem o domingo, que o considerem um dia sagrado. Ou que guardem o sábado, como pregam outras religiões. Para mim, todos os dias são sagrados, e devemos agir, em todos eles, com correção, bondade e solidariedade. Portanto, diferentemente de Eric Liddell, eu teria participado da prova dos 200 metros no domingo. Nem por isso deixo de admirá-lo pela solidez de sua fé e pela defesa intransigente de suas convicções.

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