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Irritações 2: Missão Incompreensível

Irritações 2: Missão Incompreensível

Por Sérgio Piva

Por Sérgio Piva

Publicada há 3 anos

A espera é inimiga número um dos ansiosos, dos irritados, dos chatos e afins. O esperar também não é uma qualidade cultivada pelas mulheres em geral. Quando o homem se atrasa quase cinco minutos para um compromisso, com horário previamente agendado, naquele intervalo, recebeu no mínimo trinta e duas ligações telefônicas de sua companheira, sem contar a infinidade de mensagens no WhatsApp, não lidas pelo réu, digo, parceiro, apenas calculadas mentalmente pela soma dos avisos sonoros.

O coitado, se chega no horário marcado, pode esperar a ilustre dama o tempo que for, sem nunca poder reclamar, afinal, pensa que é fácil escolher uma roupa que combine com o sapato, um sapato que combine com o brinco, que combine com o anel, que combine com o echarpe e que tudo isso combine com alguma bolsa? 

Mas o bendito que atrasou muito tempo, na contagem da mulher, cinco minutos no horário oficial de Brasília, ouve sempre a mesma reclamação: estou plantada aqui há um tempão. Se regar, nasce um broto de raiva, que adubado, dá origem a uma muda de fúria. 

De qualquer forma, ficar esperando por alguém ou alguma coisa, não é tarefa fácil, especialmente sendo curto o tempo disponível para quem espera. Muito mais nos dias atuais, quando a maioria das pessoas tem muito pouco tempo para fazer todas as tarefas agendadas pela chamada vida moderna e muito menos intervalo para dedicar às atividades de lazer e recreação.

Por isso, o esperar atualmente tem sido uma missão quase divina, mais para tema de filme que para dar nome a uma qualidade de mortal comum. A época em que pressa e pouco tempo eram reservados aos homens de negócios, aos grandes empresários com agenda cheia, já não mais existe. Hoje, quase todo mundo está atarefado até a tampa.

Excetuando-se as namoradas, esposas e afins, os irritados, chatos e ansiosos, a manifestação de impaciência nas pessoas têm beirado a normalidade. Mesmo assim, quando falamos em prestação de serviços, parece mais plausível ainda que o esperar cause irritação, não somente pela espera adquirida juntamente com o trabalho a ser executado, como venda casada, mas sem constar nas letras miúdas do contrato, mas também por outros motivos difíceis de entender, quanto mais deglutir. 

Existe um impedimento no raciocínio lógico que não me deixa compreender o motivo dos prestadores de serviços quase nunca atenderem o cliente no horário combinado. Chegam horas atrasados, quando chegam. 

Mais difícil ainda, é entender o porquê, caso realmente tenha havido um empecilho ou incidente (como sempre dizem ter ocorrido) que os impediu de estar no lugar agendado na hora marcada, não avisam sobre atraso que irá ocorrer, em plena era da comunicação, quando noventa e dois por cento dos lares brasileiros têm celular, sendo possível fazer e receber ligações ou, se não tiver crédito, mandar uma mensagem de texto. 

Comigo já aconteceu de passarem-se semanas da data marcada para o atendimento do profissional sem que ele tenha entrado em contato para esclarecer sobre a razão de não ter aparecido ou, ao menos, regurgitar uma daquelas desculpas clássicas listada no “Guia Completo para Enrolar Clientes” (42ª Edição – ARASÔ - revista, atualizada e sonorizada). Detalhe, ainda constam no guia frases e desculpes do mesmo ano de fundação de São Vicente. 

A dúvida maior que paira na minha cabeça é sobre a assistência posterior, em alguns tipos de serviços, por uma questão de lógica, pois se o atendimento anterior ao trabalho é precário, imagine como será demorado o socorro em caso de eventuais problemas no serviço executado. 

Outro tipo de espera incompreensível é aquela sucedida nas antessalas dos consultórios médicos. A coisa já começa estranha quando você liga para agendar a consulta e a secretária informa o horário marcado e também, logo em seguida, em raros casos, dá a notícia de que atendimento é por ordem de chegada, ou fica sabendo disso quando chega ao consultório. 

Como assim? É horário marcado ou por ordem de chegada? Ou um ou outro. Então você espera no mínimo uma ou duas horas em média, depois do “horário marcado”, para ver a cara do médico.   

Podem dizer que no caso dos cirurgiões é possível haver emergências ou a cirurgia estender-se além do planejado. Até pode, certas ocorrências são imprevisíveis, ainda que a maioria das cirurgias seja realizada em horário determinado e o tempo de duração ocorra dentro do estimado.

Mas o que dizer dos demais médicos que não se enquadram no caso citado. Já cronometrei o tempo de consultas em vários especialistas, nos longos momentos em que aguardava minha hora. O tempo em que os pacientes permanecem dentro dos consultórios não diverge muito, de acordo com cada especialidade.

Além do mais, com tantos anos de experiência em atendimento, certamente o médico sabe o tempo que gasta em cada consulta. Sendo assim, fica fácil marcar um horário para seus pacientes e conseguir efetuar a consulta sem muito atraso, posto que esperar vinte minutos, até meia hora, se necessário, não é um longo intervalo, mas uma ou duas horas, nem o próprio médico esperaria para ser atendido quando buscasse por um serviço. Quem dirá três horas, como já esperaram muitas pessoas que conheço para serem consultadas.

Algum médico que por ventura esteja lendo este texto pode dizer que a saúde é prioridade e, na busca da cura, deve-se estar preparado para enfrentar qualquer situação. 

Claro, saúde é prioridade e paciência deveria ser sempre adjetivo do paciente, embora colocar-se no lugar do outro que, se enfermo, pode estar tanto física como emocionalmente debilitado, também é uma prioridade para os profissionais da área da saúde, tanto mais para pessoas com alto grau de instrução. 

Além do que, a missão de atender o paciente, ou impaciente, no horário agendado não é impossível. Conheço vários profissionais da área médica que são capazes disso. 

Faz dez anos que faço meus check-ups no IMC em São José do Rio Preto, sendo atendido pelo Dr. Jorge Cury Junior, que nunca me fez esperar mais do que dez minutos, leia-se “dez minutos”, do horário marcado, me examinando com paciência, deixando eu perguntar todas as minhas dúvidas, sempre com a tranquilidade e sinceridade, que lhes são peculiares, como deve fazer com os demais consultados, já que não sou mais especial que outros pacientes.

Qualquer que seja a prestação de serviços, ou quanto custe o trabalho, o bom atendimento sempre foi e continuará sendo a melhor e mais barata propaganda que qualquer profissional tem a sua disposição. 

Da mesma forma, o excelente profissional é avaliado pelo conhecimento e destreza que possui ao diagnosticar problemas, propor e executar soluções com eficiência e, em relação à área da saúde, o tratamento humano mais próximo possível do paciente contribuirá para o alcance prognóstico com mais facilidade e do tratamento com maior eficácia, além do fato de ser esperado daquele que deveria deter mais que conhecimento, preferencialmente sabedoria, um comportamento característico das pessoas notáveis: o respeito. 



Sérgio Piva

s.piva@hotmail.com


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