ARTIGO

O ÚLTIMO DO ANO

O ÚLTIMO DO ANO

Por Pablo Dávalos

Por Pablo Dávalos

Publicada há 3 anos

A vida é um grande teatro, e na maior parte do tempo estamos apenas atuando. Ouvi essa frase recentemente de uma pessoa pela qual tenho muita consideração e respeito, refleti por alguns instantes sobre ela e conclui que faz todo o sentido. É doloroso saber que depois de um ano tão desgastante, devastador e impiedoso, não aprendemos muita coisa. Continuamos fingindo sentimentos, continuamos sem conhecer o sentido de sermos empáticos ao lidar com pessoas próximas a nós. É provável que em algum momento deste ano tenhamos perdido algum amigo, parente ou conhecido, mas continuamos como cegos à procura de um fecho de luz que nunca encontraremos enquanto a nossa insistência por cuidar do próprio umbigo for maior que a misericórdia suficiente para olhar ao nosso redor e estender a mão a quem precisa. Continuamos atuando com sorrisos no rosto, preocupados com o que os demais pensam de nós, ignorando a importância de ser uma pessoa melhor hoje comparado com aquilo que fomos ontem.

Thomas Watson certa vez disse que a maioria dos homens costuma orar mais por bolsos cheios do que por corações puros, nada mudou de anos para cá. Enquanto a procura frenética por materialismo existir, sentimentos puros e genuínos são cada vez mais escassos. Palavras como amor e bondade passaram a inexistir no vocábulo cotidiano e em alguns casos são motivos de chacota. Somos testemunhas de uma geração que foge de relacionamentos sérios. Carreira e ambição profissional são as desculpas usadas com tenacidade para explicar o desapego emocional, mas como todo excesso esconde uma falta, em alguns casos não há o que esconder, os olhares não disfarçam a insatisfação da alma. Filhos bem sucedidos preferem colocar pais em asilos com a desculpa de que “lá tem profissionais melhores para cuidar de nossos velhos” e exibem o sucesso e conservadorismo na igreja aos finais de semana, netos dizem estar ocupados para acompanhar seus avôs em consultas médicas, mas vivem conectados nas redes sociais com os bombardeios de “stories” em festas regadas a bebidas e “good vibes”. Para os mais jovens, beijar várias bocas é mais importante que construir lares e descobrir a felicidade de construir uma família. Geralmente a maça do Iphone é mais importante que o bate papo com aquela mulher ou homem que fizeram de tudo para você nascer. Atuar, neste eterno teatro está sendo um exagero com a paciência de Deus e talvez por este motivo Ele deixou de atender as nossas suplicas.

Dia desses, estava dirigindo para minha casa após um dia exaustivo de trabalho, e quando o semáforo fechou pude notar logo a minha esquerda no canteiro central uma cena que não consigo esquecer: um morador de rua, cedendo seu único cobertor para dois pequenos cachorros que dormiam com um semblante de tranquilidade perto de um carrinho de supermercado com alguns apetrechos e reciclagem. Simplesmente desci o vidro do carro e fiquei fixado olhando para aquilo com milhões de pensamentos até ser lembrado com a gentileza de uma buzina impaciente do carro atrás de mim que o semáforo tinha aberto. Pouco menos de uma semana depois, em um dia chuvoso em outro semáforo, quando parei para dar algumas moedas a outro morador de rua tive o infortúnio de dizer inconscientemente “amigo sai da rua para não se molhar”, o idoso parou por um segundo, me olhou meio tímido e respondeu: “senhor eu moro na rua, estou acostumado já, vá com Deus e Deus o abençoe”. São coisas dessa natureza que me levam a pensar que temos muito que melhorar como seres humanos, que nossas preocupações e desejos nada tem a ver com o que realmente importa. As melhores lições costumam vir de mestres que nunca estudaram e acredito que poderíamos aprender por horas, dias e anos de pessoas simples como estas. Deus habita no simples e somente depois que decidimos entregar nossas vidas a Ele, mesmo sofrendo com a dificuldade de abandonar os vícios do mundo, começamos a reaprender e sentir que é compaixão, começamos a sentir uma mínima parcela daquilo que Jesus sentiu por nós ao morrer para pagar todos nossos pecados.

Tempo, é um recurso muito limitado, hoje estamos aqui mas talvez daqui a vinte minutos não estaremos mais, um dia ou uma semana, quem sabe qual é o ponto final daquilo que chamamos de vida? Tempo é precioso, por isso ao invés de atuar, aconselho a você que procure ter certeza que você está gastando o seu com as pessoas certas, com as amizades certas, com o emprego certo, com a vida certa que deseja ter. Sexo é apenas sexo, bebidas são um dia a menos de vida, status é temporário, carreira acaba, a vida chega ao fim quando você menos se der conta. Desejo de todo coração que tenhamos aprendido uma lição com este ano atípico, desejo que deixemos de atuar, e desejo que o ano que está por vir seja milhões de vezes mais cheio de esperança, bondade, felicidade, paz, amor, saúde, prosperidade, conquistas, harmonia, oportunidades, ternura, equilíbrio, grandes romances, otimismo, paixão e uma vida de qualidade. 


Pablo Dávalos

Engenheiro de Produção e Gerente Administrativo, com formação na metodologia Green Belt Six Sigma e Black Belt Six Sigma e certificação SAP no módulo Planejamento e Controle de Produção.

MBA em Gestão Industrial pela FGV (em andamento)




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