HISTÓRIAS DO T

Tecnologia de ponta dos anos sessenta

Tecnologia de ponta dos anos sessenta

Por Claudinei Cabreira

Por Claudinei Cabreira

Publicada há 7 anos


Pouco tempo depois que meu pai havia acabado de construir a nossa casa, na antiga Avenida Doze, no Jardim Santista, uma bela tarde ele chegou em casa feliz da vida, dizendo para minha mãe que tinha feito um “negocião da China” na Loja Benfati, que ficava ali na Rua Brasil, mais ou menos onde é hoje o Boticário e a Erva Doce Modas. A grande notícia, era que ele havia comprado uma “moderna radiovitrola elétrica e automática”, da Semp, que tocava sozinha até doze discos colocados de uma só vez. Aquilo sim, era a última palavra em modernidade eletrônica. Um luxo! Corria então o ano de 1965 e naquela região da cidade, a energia elétrica ainda não havia chegado. 


A rede de fios na antiga Avenida Doze chegava só até a esquina da Rua Paraná, duas quadras e meia acima da nossa casa. Dali para baixo, todo mundo se virava à luz de velas de parafina, com lamparinas à querosene ou os fluorescentes lampiões à gás. Rádios ou vitrolas, só movidos à pilhas, baterias ou manivelas. Para ser ter uma idéia do que era a vida sem a tal da “luz elétrica”, naquele tempo, para se lustrar e deixar brilhando o piso de vermelhão das casas, era aplicada a famosa cera Parquetina, e para dar o brilho,  só passando o pesado escovão de ferro, de um lado para outro, um monte de vezes. Era preciso ter “muque”! 


Diante disso, a nossa famosa “radiovitrola elétrica e automática”, que ficou como um belo enfeite mudo na entrada da sala, teve que esperar uns dois anos para ser “inaugurada”, lá pelo  final de 1967. Agora, quando os caminhões da antiga Uselpa (mais tarde Cesp) começaram chegar trazendo os grandes postes de aroeira, que eram deixados nos pontos onde seriam erguidos, o povo do bairro entrou em polvorosa: era o progresso que chegava para mudar a vida das pessoas. E como mudou. Trocar as velhas lamparinas à querosene e os lampiões à gás, pelas chiques, modernas e brilhantes lâmpadas de 60 watts (as mais fortes), era um acontecimento histórico. 


Na época da inauguração da energia elétrica, teve até comício no bairro com a caravana do então prefeito Percy Semeghini, que era da Arena. Além do prefeito, apareceram por lá o vice Jacob de Angelis Gaeti, os vereadores Feres Bucater, Antonio Garcia Pelayo, Gentil Franco de Almeida, Wagner Costa, Jorge Aidar, José (Zé Cearense) Antonio de Figueiredo, Matsuo Yendo,  o “brabo homem da carabina” José Akira Massuda (do Badirândia) e inúmeras outras autoridades do município. Depois de intermináveis discursos dos políticos, por volta de 20,30 horas, quando a chave do transformador, instalado num poste diante do campinho de futebol onde hoje é a Praça do Santista, foi acionada com uma alavanca pelo prefeito, foi uma festa. Teve muitos vivas, salvas de palmas e até queima de fogos. Naquele tempo o povo prestigiava as inaugurações. 


Os políticos faziam discursos apaixonados. Foi a luz “chegar” e o comício se esvaziou. A maioria das pessoas foram às pressas para suas casas  estrear e conferir se estava tudo certinho com as lâmpadas, eletrodomésticos “novos” como rádios, vitrolas, liquidificadores, geladeiras, enceradeiras,  etc. Nossa família que era “pachequista roxa”, claro, não iria lá prestigiar o comício da oposição. Então, ficou todo mundo olhando de longe, inclusive alguns vizinhos, “convidados” para a inauguração da tal radiovitrola. Bastou “a luz chegar “ lá em casa e os adultos, apressadamente se acomodaram nos sofás e também a molecadinha; todo mundo sentadinho e bem comportadinho no piso de vermelhão. Aquele sim, era um momento único, de encantamento. 


Todos muito curiosos, de olhos grudados naquela coisa, nenhum pio na sala. Meu pai foi lá, meio que receoso, ligou a radiovitrola e colocou um LP (long play) de vinil de 78 rotações, do humorista Barnabé, onde o artista contava suas piadas, entrecortadas por uma ou outra música, bem ao estilo do velho Mazzaroppi. Eram piadas muito bem elaboradas e sadias, sem apelação. Naquela noite teve “bis” de Barnabé várias vezes. Depois, quantas vezes ouvimos aquele disco e rimos até rolar no chão, só Deus sabe. Também pudera, a gente só tinha aquele disco. Apesar das enormes dificuldades econômicas, todos se contentavam com muito pouco. Eram realmente tempos felizes. Semana que vem tem mais. Até lá.

últimas