HISTÓRIAS DO T

Clube da Memória

Clube da Memória

Por Claudinei Cabreira

Por Claudinei Cabreira

Publicada há 6 anos

Corria o ano de 1966 e Fernandópolis, apesar das eternas brigas políticas entre percylianos e pachequistas, experimentava uma fase áurea, vivendo dias de franca expansão e desenvolvimento, Mas, deixando de lado as diferenças políticas existentes entre os dois grupos, a cidade vivia um momento fantástico com as suas memoráveis safras de café e algodão. Naqueles tempos a cidade já contava com a Sandra e a Anderson & Cleiton, duas das maiores beneficiadoras de algodão do país. Embalada com tamanha movimentação, a cidade começava nessa época a construção do IBC, do CEAGESP e do EELAS, entre outras grandes obras. O comércio fervilhava de tanta gente e movimentação.


Naquela época eu tinha 14 anos de idade, como já disse antes, trabalhava como aprendiz no Escritório União, do saudoso Dante Esmerini (agora, sob a batuta de Maurílio Brassalotti), que funciona até hoje, no mesmo endereço.

Do outro lado da avenida, a Coferauto, a pioneira agência Volkswagen de Jayme Migliorini, que vendia fuscas igual pipoca em porta de circo era só festa, comemorando mês a mês os recordes de venda. Era o carro preferido de professores, bancários, funcionários públicos, pequenos comerciantes e sitiantes. Havia fila de espera, e naquele tempo o consórcio ainda não havia sido inventado. Fazendeiros, autoridades e pessoas mais abastadas, compravam Aero Willys, Sinca Chambord ou os importados Impala ou Oldsmobille. Eram tempos efervescentes.


A Padaria União inaugurada em 1963, pelos irmãos Adelino e José Maria Alves, vindos de Araraquara, havia se tornado o principal ponto de encontro das redondezas do antigo “Balão”, para o tradicional cafezinho entre amigos. Ali se reuniam autoridades, políticos, empresários, fazendeiros, viajantes e funcionários das empresas da vizinhança. Era o “point” ideal para se saber dos últimos acontecimentos da progressista Fernandópolis, e também para colocar a conversa em dia com os amigos.


 Mais tarde, o lugar passou a ser conhecido como “Senadinho”, onde eram discutidos relevantes assuntos de interesse da comunidade. Em outras palavras, por décadas, transformou-se no principal, senão o mais importante bastidor da política local.


Era um movimento danado, que começava logo nas primeiras horas da madrugada, com a chegada das carroças dos padeiros, formando fila para carregar e depois abastecer a cidade com os pães bem quentinhos, que eram entregues em domicílio. E na sua lida diária com tanta gente, todo santo dia, José Maria Alves, logo se tornou uma das pessoas mais conhecidas e queridas de Fernandópolis. Nascia ali, atrás do balcão daquela padaria, uma das mais importantes e influentes lideranças que a cidade já teve.


Mas, apesar do cansativo e ininterrupto batente diário, de domingo à domingo, o eclético “Portuga” como ficou conhecido, era um sujeito bem humorado e sempre arranjava um tempinho, para aprontar uma ou outra “pegadinha”, com os amigos mais chegados. No bom sentido, quem conheceu Zé Maria, sabe que ele não era flor que se cheirasse.


Pois bem. Um belo dia, algum “amigo da onça” teve a luminosa e brilhante ideia, de ligar para todos os pontos de carrinhos de carga da cidade. Imitando com perfeição a voz e o conhecido sotaque do bom Portuga, dizia que tinha que “fazeire” um grande carregamento de lenha e que precisava de todas as carroças disponíveis naquele ponto e de todos os outros pontos da cidade. E que chamassem os amigos disponíveis, também.


Lembro-me como se fosse hoje. De uma hora para outra, a Avenida Líbero de Almeida Silvares, defronte a antiga Coferauto, ficou entupida de carroças dos dois lados. Dentro da padaria, um monte de carroceiros querendo saber onde estava a tal carga para ser transportada. Do outro lado do balcão, um Zé Maria perplexo, tentando explicar que deveria haver algum grave engano, pois ele não havia ligado para ninguém, nem tinha transporte de carga alguma para ser feito. Foi uma manhã tumultuada e só depois de muita conversa e explicações, a vida voltou ao normal. Menos para o Zé Maria, que subiu nas tamancas e queria por que queria, saber quem tinha sido o “bom filho da mãe” que havia aprontado aquela arte, justo com ele.


O autor da façanha, lógico, nunca foi descoberto e nem delatado. E quem sabia, se é que alguém sabia o nome do “artista”, jamais abriu o bico. Mas Zé Maria desconfiava de três amigos muito próximos: o Carlão Fontenelle, da Ótica Visão; o Osmundo Dias de Oliveira, da Agência Caiçara e o Álvaro de Souza, da antiga Casas Matos Calçados. E ele tinha lá razões de sobra para desconfiar do trio, até porque, eles eram fogo no boné do guarda.


Por outro lado, a história de José Maria Alves é muito rica e deve ser contada em um livro. Esgotar o assunto, em uma, duas ou três edições neste espaço, é uma afronta à sua saudosa memória, aos seus amigos e familiares. Há passagens importantes, como o dia em que “vi ao vivo”, o grande incêndio que destruiu completamente a padaria e desesperado, ele queria se jogar no meio do incêndio. Homem de bem e grande batalhador das causas da cidade, foi mentor de importantes e memoráveis conquistas. E sobre isso, voltaremos ao assunto em outras oportunidades. Promessa é dívida.


Mas voltando ao episódio dos carroceiros, Zé Maria sempre desconfiou que o mentor daquela traquinagem, foi o seu querido amigo Osmundo. O tempo passou e um belo dia, como era de se esperar, o troco veio. E foi lá na Agência Caiçara, junto com o Álvaro da Matos e o Carlão da Ótica e aprontaram uma “arte” das boas, com o velho e saudoso Osmundo. E aí o Zé Maria se sentiu vingado, no bom sentido, claro. Mas essa história, eu conto outro dia. Semana que vem tem mais. Até lá.




últimas