Sergio Piva

Cecília

Cecília

Por Sergio Piva

Por Sergio Piva

Publicada há 6 anos

Por Sergio Piva



Antes mesmo de conhecê-la pessoalmente já gostava dela. Era um misto de alegria e apreensão, afinal, imaginar é uma coisa, mas o contato físico é outro. Curiosamente o medo de outrora se dissipara desde o momento que comecei a aguardar pelo nosso encontro.


Meu pensamento viajava, em muitas ocasiões, sem querer prever o futuro, tentando programar sua recepção, imaginando como deveria agir em sua chegada, como poderia me portar, de que maneira precisaria conduzir nosso relacionamento de modo a oferecer o melhor para ela.


A teoria, na prática, é relativa. Mesmo não tentando prever minhas reações no momento do nosso encontro, foi completamente diferente daquilo que poderia planejar ou imaginar.


O local era bem iluminado e repleto de gente. Sabia que haveria pessoas lá, mas não tantas quanto naquele dia. Todas pareciam felizes como eu, ainda que também não soubessem nada sobre ela.


Quando ela surgiu, misturaram-se mais ainda os sentimentos, não sabia se ria ou chorava. Decidi sorrir e mostrar minha felicidade e meu contentamento por ela, finalmente, estar presente na minha vida.


O olhar curioso dela, olhando para todos os lados, tentando se ambientar, tanto quanto eu estava, foi fascinante. O rosto delicado, a boca rosa desenhada e a uma marca na pele que a tornava mais exclusiva, completavam a imagem que fazia dela única, ao menos para mim, naquele momento simultaneamente passageiro e infinito.


Senti-la-ia, de fato, ao encostar a cabeça em meu peito e, com sua pequena estatura, sem que os braços pudessem envolver todo meu corpo, me abraçar e repousar calmamente em minha alma. Foi naquele instante que o amor que brotava do encontro de nossas vidas tomou conta de todo meu ser, fazendo brotar uma felicidade que se materializava exteriormente naquela que eu abraçava pela primeira vez e crescia para dentro de mim, estendendo suas raízes na minha existência etérea, percorrendo todo meu corpo trocando os nutrientes, mutuamente benéficos, chamados felicidade e amor. Não necessariamente nessa ordem.


Nasceu a Cecília. Nasceu uma plebeia. Não vai ser princesa, decidimos assim. Até porque, pela quantidade de príncipes e princesas que nascem todos os dias, não vai haver castelo para todo mundo.


Não será princesa por vários motivos. Primeiro, porque a casa da felicidade não se intitula castelo, se chama amor. Segundo, para que ela, se achando princesa, não fique eternamente procurando um príncipe em seu cavalo branco e não acabe apenas com o cavalo, ou viva beijando sapos, esperando que virem príncipes e, no final das contas, acabe dormindo o resto da vida com alguém coaxando em sua cama.  Para que também não pense que todas as outras pessoas sejam seus súditos e precisem obedecê-la ou fazer suas vontades, dentre todas as outras benesses que tem ou quer impor a realeza aos que são imaginados subalternos.

Nesse um mês, não me deixou dormir, mas me fez sorrir. Não me deixou escrever, mas seu sorriso deixou ver. Não me deu sossego, mas me trouxe apego. Não me deixou fora de casa por meu nariz, mas me fez feliz. Noite quase em claro, nem reparo. Gritos no banho, nem me acanho. Espetáculo para trocar, nem deu para ligar. Nada foi de reclamar ou bramir, se até arroto e pum me fez sorrir. 

  

Não espero que seja santa, apenas Cecília. Espero que cante, encante e decante, o positivo em negativo, o amargo em mel. Que goste muito da luz e pouco do escuro, apenas para repousar bastante e meditar quando necessário. Que sua música transforme o passado em presente e o presente em futuro. Que sua inspiração ilumine seu caminho e sua canção, seu brilho aqueça seu carinho e dissipe sua ilusão.


Quero que faça tudo o que pretender, desde que o que lhe convenha seja lícito e, ainda assim, não se deixe dominar nem pelo que for ruim nem tanto quanto pelo que for bom. Quero que não cometa os mesmos erros de seus pais, mas suas próprias falhas. Quero que aprenda a aprender, a depender, a ser autônoma e a crescer. Cada qual na sua hora.


Quero que seja livre, que bata suas asas de borboleta e que esse movimento gere vento suficiente para varrer sua estrada e transformar seu futuro, como transformou meu presente e minha mente. Quero que seja sempre como está sendo, presente. E que seja gente.


Tudo isso (e muito mais) é apenas aquilo que eu quero. Esperemos, agora, para sabermos o que ela vai querer. A única certeza é que terá toda nossa atenção, sem ser o centro dela. Porque os vértices de nosso triangulo, e suas medianas, terá o centro de gravidade não com nome de gente alguma, certamente com nome de sentimento e consentimento chamado amor.


Adiante das nossas convicções, perseveram os desejos: que seja calma como a água, perigosa como o escorpião, cega como a justiça, protetora como a santa, poetisa como o nome, ou tão somente filha, apenas ela: Cecília.

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