Bárbara Araújo Oliveira
Mais um Spielberg.‘Jogador N.º 1’ estreou aqui no Brasil em março
A adaptação de Steven Spielberg da primeira obra literária de Ernest Cline — a partir do livro, com o título original de Ready Player One, publicado em 2011 nos EUA e, um ano depois, traduzido para o português pela editora LeYa —,Jogador N.º 1 começou a ser produzida em 2016, chegando aos cinemas em março de 2018.
O ano é 2044 e Wade Watts, o protagonista da trama, vive em um mundo de caos, pobreza e extrema insuficiência dos recursos necessários à boa condição de vida. Mas nada disso realmente importa. A população que deveria estar preocupada e com a atenção voltada às atrocidades atuais está completamente conectada ao OASIS, uma realidade virtual que, muito diferente do mundo real, é um lugar cheio de possibilidades.
James Halliday, o criador do OASIS,falece e resolve deixar todo o seu dinheiro e os direitos sobre a utopia virtual àquele que conseguir encontrar o easter egg escondido dentro do jogo.Para chegar a este, são necessárias três chaves. Wade é quem encontra a primeira, com a ajuda de seus amigos, que também estão à procura do ovo, avançando cada vez mais para a chance de ser o grande ganhador.
A relação do protagonista com seus amigos e com o seu par romântico ultrapassa o limite do virtual: uma crítica aos vícios em internet. A história traz um paralelo entre a vida de Halliday e a de Wade,criando um comparativo. James, que sempre foi solitário, é colocado como um lembrete do que não se deve fazer, enquanto o protagonista é alguém que luta para tomar boas decisões em sua própria vida e manter os amigos por perto. “Por mais assustadora e dolorosa que a realidade possa ser, é também o único lugar onde se pode encontrar felicidade de verdade (...) a realidade é real”, o mais velho adverte. Viver uma fantasia é divertido, mas esquecer que existe um mundo real é prejudicial, ainda mais quando ele está caindo aos pedaços e precisando de atenção.
O contrapeso dos amigos na história é Nolan Sorrento, dono da I.O.I (Innovative Online Industries),que, juntamente com seus funcionários caçadores de ovo, tenta de todas as formas atrapalhar o garoto tanto dentro do OASIS quanto na vida real. Sorrento tem como objetivo implantar custos ao uso do jogo e impedir que a população tenha acesso total a este. Ele é o típico vilão ambicioso demais e habilidoso de menos. Fica sentado esperando que os outros façam o que ele não consegue fazer. Poucas vezes houve tanto tédio com um vilão quanto com Nolan (conseguiu superar até mesmo Kylo Ren em Star Wars VII).
Por conta da obsessão de Halliday com os anos 1980, a história é um baú cheio das melhores joias produzidas na década, incluindo filmes, música, moda e,claro, os videogames. Apesar de a afirmação ser cabível a ambas as obras, é aqui onde elas mais divergem uma da outra, talvez por ter sido onde Spielberg se sentiu mais livre para colocar sua identidade. Cheguei à conclusão de que o diretor incorporou o grande criador Halliday e fez do filme o seu próprio OASIS. A prova está no uso de referências como O Ilumidado e Chucky, que não aparecem no livro em momento algum. Enquanto Steven explicita seus gostos pessoais, Ernest abre um leque enorme de referências, criando um personagem que é tão entendedor e apaixonado pela cultura popular na história. Isso não diminui Spielberg de maneira alguma, muito pelo contrário, só destaca a facilidade que o diretor tem para ousar e fazer aquilo que nasceu para fazer.
A conclusão é, enfim, de que a história é perfeita para os fãs da cultura nerd ou os que querem se aprofundar nela. Além de muito divertida e entusiástica, leva-nos ainda a aprender e a refletir sobre assuntos importantes e atuais como a evolução da tecnologia: vale a pena deixar de lado os pequenos detalhes negativos e aproveitar esta empolgante história. E não, o livro não é melhor que o filme ou vice-versa, uma vez que cada um tem sua singularidade: daí o que pode é variar, de pessoa para pessoa, gostar mais da obra literária ou cinematográfica.