Histórias do T

Lembra dos “trotes” de antigamente?

Lembra dos “trotes” de antigamente?

Claudinei Cabreira

Claudinei Cabreira

Publicada há 6 anos

Se tem uma coisa nessa vida que eu gosto, valorizo e aprecio muito é reencontrar velhos amigos. Tempos atrás encontrei o Newton Carlos Esmerini, o Nirtão, lá no Despachante União, bem ali defronte a Faria Veículos. Aí chegou o Maurilio Brassaloti e a prosa encompridou. Então, senta que lá vem história.


Lá pela metade dos anos sessenta, ainda molecote, trabalhei junto com o Nirtão e seu irmão Marquinho no Despachante União, que até hoje continua no mesmo prédio e endereço, mas que naquela época era do pai deles, o saudoso Dante Esmerini. E é claro que nos lembramos dos velhos e bons tempos, de algumas passagens e histórias daquelas de arrancar pica-pau do oco do jatobá.


Nossos vizinhos eram os irmãos da Casa de Carnes Bonassi, da Adega Caxiense, do Mercadinho Koyama, o Leonardo Inocente, o Chichinha da Retífica, a moçada do Bradesco onde o Brahminha era o gerente, e é claro, a Padaria União dos irmãos Adelino e o saudoso Zé Maria Alves, o bom portuga. Claro que todos os nossos amigos portugas são bons, mas o Zé Maria, como se dizia naqueles tempos, era “fora de série”.


Fala de uma coisa, fala de outra, foi aí que o Tim (esse era o apelido do Nirtão) lembrou das encrencas que enfrentamos no nosso trabalho, onde a parte mais complicada era tirar decalques copiando números de chassis e motores de veículos para licenciamento e transferências. Brabo mesmo era quando chegavam aqueles jipes Willys, os caminhões Alfa Romeo, os Fenemês e os caras-chatas da Mercedes-Benz, que chegavam com seus motores fervendo. Nossos dedos já estavam calejados, mas mesmo assim fritavam!


Naquela época, todo mundo pegava no batente desde muito pequeno e não tinha essa coisa de corpo mole, não. Mas também sobrava tempo para aprontar nossas “artes” e alegrar o nosso dia-a-dia com traquinagens nada politicamente corretas, mas sempre criativas e bem humoradas. Eram outros tempos e as pessoas não tinham essa “afetação” de hoje em dia. Aceitavam as brincadeiras numa boa e todo mundo era feliz.


Foi aí que nos lembramos do dia que o “Tim” teve a luminosa ideia de pedir para que eu lavasse a fita da sua máquina de escrever. Como eu era “novato” e ainda estava no famoso prazo de três meses de experiência, achei aquilo meio estranho, mas não questionei a ordem do filho do patrão. Fui lá nos fundos do escritório e fiz o serviço. O Nirtão que já era “macaco veio”, vazou na braquiara.


Quando vi minhas mãos roxas de tinta, percebi o tamanho da sacanagem. Não pensei duas vezes, nem perdi a elegância. Peguei aquela fita quilométrica e a estendi ainda molhada, pingando tinta, para secar sobre a escrivaninha do Nirtão. Minutos depois chega o “seo” Dante e de cabelos em pé e olhos arregalados me perguntou o que era aquilo. Claro, como se diz hoje em dia, fiz a tal da “delação premiada”. Entreguei de bandeja e com alegria da vingança, o Nirtão para o nosso Sérgio Moro daqueles dias, o velho e austero Dante Esmerini, claro!


Se o Nirtão levou uma coça ou alguns bons e merecidos puxões de orelha do velho Dante, não sei até hoje e nem mais me interessa isso.  Só que depois daquele dia, ele ficou esperto e nunca mais aprontou comigo. Ao contrário, dali prá frente sempre fizemos muitas artes juntos, mandando os “novatos” rodarem a cidade levando e buscando a famosa máquina de “achar diferença na contabilidade”.Eram  dois blocos de concreto dentro de uma caixa de papelão, com um aviso muito importante: “Cuidado, frágil” . É nessas horas que a criatividade é maldosa.

Mas isso não era privilégio dos escritórios. Nas serralherias tinha a famosa cola feita com água e pó dos esmeril e o famoso martelinho de borracha “pra desentortar vidros”.Nas oficinas tinha o transporte da famosa e caríssima peça, a “rebimbóca da parafuseta”. O povo erra terrível.


Claro que as notícias correm o mundo e de um jeito ou de outro, as notícias chegavam no pé da orelha de tudo que é ser vivente. Naqueles tempos “o noticiário” era na base do “boca-a-boca” e logo a molecadinha novata nos escritórios, ficou esperta com essa coisa da “maquininha de achar diferenças na contabilidade”. A mesma coisa deve ter acontecido nas serralherias e oficinas da vida. Então era preciso inventar alguma coisa nova. E a turma dos escritórios inventou o transporte do “Pavilhão Nacional”, “era uma coisa solene e uma baita responsabilidade”. E mais, tinha uma autoridade esperando a entrega do pavilhão no horário certo, esperando a entrega do “símbolo nacional”. Tudo muito solene e cívico.  Mas esse último tipo de trote não deu muito certo e não durou muito tempo. A molecadinha começou ficar esperta.


Lá se vão cinquenta e tantos anos e quem nunca fez ou passou por uma brincadeira dessas, levante a mão. Era a forja da vida, o nosso jeito de ajudar as pessoas pensarem, raciocinarem antes de fazer as coisas. Era o nosso jeito de educar e ensinar para a vida e mostrar os primeiros passos na trilha no trabalho. Isso é sério e ainda vai virar assunto para outro Botinão.. Semana que vem tem mais. Até lá!

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