HISTÓRIAS DO T

Lembra da telefonista?

Lembra da telefonista?

Por Claudinei Cabreira

Por Claudinei Cabreira

Publicada há 6 anos


Quando digo que moçadinha de hoje em dia, chora de barriga cheia e vive na mordomia, eu tenho lá minhas razões. Por outro lado, é bom que fique claro que isso não é uma critica ao progresso tecnológico, nem aos privilégios que desfrutam, graças ao conforto que temos nos dias atuais. Afinal, o mundo sempre andou para frente, sempre melhorou. Sempre foi assim e assim sempre será.


Não estou em crise existencial, muito pelo contrário. Calma, que eu explico. Digo isso, para que os meninos e meninas de hoje, valorizem um pouco mais todos os benefícios e ferramentas que tem ao seu alcance e disposição. E também, para que tenham uma idéia aproximada, do grau de dificuldade que enfrentamos e tiramos de letra, na época da nossa juventude, lá pelos anos sessenta. Aqueles, sim, eram tempos bicudos!


Prá começo de conversa, ainda não havia sido inventada a internet, Google, Facebook, wat-zap, celular, smartphone, notebook, MSN, DVD, CD, MP5, câmera digital, rádio FM, TV à cabo, de plasma e digital. Só lá por volta de 68, surgiu por aqui ajurássica TV em preto e branco. Dos quatro canais existentes no país, aqui só pegava a extinta Rede Tupi, depois de muitas brigas, virando a antena prá lá e prá cá, colocando até chumaços de Bombril na ponta da antenas internas. Quando a Tupi entrava no ar, a programação começava por volta de meio dia e ia até por volta de uma hora da manhã. Aí ficava um desenho estranho e estático na tela, nos dando boa noite, até a manhã do dia seguinte. Impressionante!


Essas consultas que os meninos fazem hoje no doutor Google, para trabalhos de escola, nem pensar. A gente tinha que ralar, correr atrás de amigos que tinham livros ou se socorrer da biblioteca municipal, até porque raras eram as escolas que tinham uma biblioteca. Ah, ia esquecendo: também não existia controle remoto e nem telefone sem fio.


Por falar em telefone, os telefones de antigamente eram uns monstrengos negros e pesados, com exceção daqueles dos quartos das madames de Hollywood, que eram verdadeiras jóias, delicados, brancos e dourados. Aliás, nunca vi um deles ao vivo, só nos filmes.


Um dos programas favoritos da juventude era pedir música nas duas únicas emissoras de rádio da cidade. Para fazer uma ligação para um programa da Rádio Cultura, de Moacir Ribeiro, ou a Rádio Educadora Rural, de Leodegário Fernandes, era uma operação de guerra, um teste de paciência. As vezes a gente ficava um tempão tentando falar, só para pedir uma música do nosso cantor ou cantora preferida, e quando não dava ocupado o tempo todo, a linha caia. Tempos da Jovem Guarda. A gente era feliz e sabia, sim.Uma brasa, mora!


       Era preciso tirar o telefone do gancho, esperar a telefonista, dizer a ela o número desejado e esperar ela completar a ligação. Se não me falha a memória, o número da Rádio cultura, era 123. Quando a gente tinha que fazer uma ligação interurbana, então, era o fim do mundo. Quando você pedia uma ligação para Rio Preto, por exemplo, primeiro informava o nome da cidade, depois o número desejado, esperava um pouco, com os dedos cruzados, fazendo figa, até a telefonista informar que a ligação seria completada em uma, duas ou três horas. Acredite se puder; a gente colocava o telefone de volta no gancho e ia cuidar da vida, voltando depois, no prazo mais ou menos estipulado. E ficava lá olhando pro tempo, pensando na morte da bezerra e esperando o telefone tocar de volta. Quando tocava, a telefonista completava a ligação e você falava. Isso quando dava uma baita sorte, de a linha não cair, não cruzar ou de encontrar a pessoa procurada. Ah, os telefones antigos, como a gente precisava gritar para conseguir ser ouvido! 


Alguns anos depois a vida melhorou muito. Surgiram os telefones automáticos, que faziam as ligações sozinhos. Esses aparelhos tinham o dial, um disco rotatório, com os números escritos dentro de buracos circulares, onde a gente enfiava os dedos e girava repetidas vezes. Quando a linha dava sinal de ocupado, era preciso fazer tudo de novo, porque não havia o “redial” de hoje. Quem nunca um dia, tomou coragem e discou para o número da casa daquela mocinha especial, para logo em seguida, timidamente mudar de idéia, ou desligar, temendo queo pai ou a mãe dela atendessem?!Com certeza, foi daí que surgiu a expressão discar, como sinônimo de telefonar. As meninas até coravam, quando diziam meio que tímidas e afobadas, disca pra mim!


Pior que tudo isso, era a onda dos trotes inocentes. Afinal, o telefone era uma grande novidade.  Crianças e até adultos, achavam graça e adoravam passar trotes bobinhos, do tipo, “você pode esperar um minutinho?”. Depois de sessenta segundos de silêncio, o trotistadizia, muito obrigado, e desligava sempre com uma risadinha sacana. Lembro que eu trabalhava numa loja de tecidos, e um belo dia uma moça ligou perguntando se a gente tinha tecido verde. Claro que eu disse que sim. E ela, rindo disse “tome cuidado senãomadura!”.


     Até pouco tempo, telefone no Brasil era um problema sério. Custava muito caro, as linhas eram vendidas e por conta disso, não era todo mundo que tinha um aparelho em casa. Como também não havia orelhões, muita gente tinha que se deslocar até o posto telefônico para fazer uma ligação, ou pedir emprestado o telefone do vizinho, da padaria, da loja, etc...


     A mesma coisa acontecia com os televisores, que eram raros, caros e poucos no nosso quarteirão tinham essa novidade. Eram os tempos da famosa Colorado RQ, com caixa de madeira e quatro pernas de pau estilizadas. Sabia que RQ significava Reserva de Qualidade? E o que isso queria dizer, juro que não sei até hoje. Eram dias sossegados, era o tempo que todo mundo era televizinho.


     Futebol da primeira divisão, a famosa Divisão Especial, a gente ouvia o poeta da bola, Fiori Giglioti, na Rádio Bandeirantes, narrando os grandes clássicos do futebol paulista, e quase sempre quando ele dizia a famosa frase,“agüenta coração!”,  a danada da onda do rádio sumia, ficava só a chiadeira. Torcedor fanático,sofria que era uma beleza. Quase todo mundo tinha um radinho de pilha transistor, com uma capa de couro cheia de furinhos e o emblema da marca, quase sempre em alto relevo de latão dourado. Era chique ter um Mitsubishi, de três faixas de ondas e antena retrátil. Pena que o nosso espaço chegou no final, mas ainda vou voltar ao assunto. Prometo. Semana que vem tem mais. Até lá.

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