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A absurda desigualdade de renda no Brasil

A absurda desigualdade de renda no Brasil

Por Carlos Eduardo

Por Carlos Eduardo

Publicada há 4 anos

Sempre foi um dos maiores problemas do Brasil. Sua prevalência em nossa sociedade se prolongou ao longo da história do país, fomentando a injustiça social, pois o seu avanço torna os pobres cada vez mais pobres (inclusive, aumentando o seu número), e os ricos, cada vez mais ricos (inclusive, restringindo o seu número). Trata-se da desigualdade social.  

Existem alguns indicadores relacionados à desigualdade social e um dos mais importantes é a desigualdade de renda que, no Brasil, encontra-se bastante acentuada.

Uma pesquisa publicada em maio de 2019 pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBR/FGV) revelou que o índice da desigualdade de renda no Brasil vem subindo desde 2015, quando se iniciou a crise econômica no país, atingindo o maior patamar da série histórica (desde 2012) no primeiro trimestre de 2019.

O índice utilizado nessa pesquisa foi o coeficiente Gini (reconhecido como principal indicador nesses casos), que monitora a desigualdade de renda numa escala que varia de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, maior é a desigualdade de renda em um país. O Brasil apresentou índice de 0,6257 em março de 2019, o que é considerado alto pelos especialistas.

Em 2017, o índice de desigualdade no Brasil era um pouco melhor (0,54) e, no entanto, o nosso país já apresentava o pior índice da América Latina, segundo publicação da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe das Nações Unidas (Cepal).

O detalhamento desse cenário mostra que a desigualdade de renda no país se relaciona com a classe social, a cor da pele e o gênero dos brasileiros.


                                                    Renda e classe social


O leitor poderá pensar: é óbvio que ser rico é garantia de receber maiores rendimentos do que ser pobre. Sim, o leitor terá razão ao chegar a essa conclusão! O problema é que essa diferença no Brasil é enorme, chega a ser absurda. 

De acordo com o “Relatório da Desigualdade Global”, da Escola de Economia de Paris, e publicado nesse ano de 2019, o Brasil é o país democrático que mais concentra renda no mundo no topo da pirâmide social. Os brasileiros mais ricos (representados pela porcentagem de 1% da população) concentram, em suas mãos, nada menos do que 28,3% de toda a renda do país. É muita concentração de renda!

Colocando nessa conta todos os países do planeta, que possuem regime democrático ou não, o Brasil cai para a vice liderança, perdendo apenas para o Qatar, e por pouco: os cidadãos mais ricos (também representados por uma porcentagem de 1% de sua população) concentram 29% de toda a renda naquele país árabe. No entanto, deve-se levar em consideração que o Qatar é uma monarquia absolutista governada pela mesma dinastia desde o século 19 (informação extraída da matéria “Desigualdade Global” publicada no jornal Folha de S. Paulo em 19 de agosto de 2019). 

O relatório de Paris ainda destaca que a média mundial de concentração de renda entre as pessoas mais ricas do planeta (1% da população mundial) é de 20,6%, ou seja, revelando-se alta também.

Comparando-se os 10% dos brasileiros mais ricos com os 40% mais pobres, nos últimos sete anos, a renda dos mais ricos aumentou 8,5% e a dos mais pobres caiu 14% (dados publicados em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas). 

Em outras palavras, quem era rico ficou mais rico nos últimos anos, e quem era pobre, empobreceu mais ainda no mesmo período, revelando que a crise econômica que assola o país prejudica os mais pobres e favorece os mais ricos. Injustiça das injustiças!

Não precisa ser especialista em Economia para perceber que algo está bem errado nesse cenário.


                                                     Renda e cor da pele


Pesquisa bem recente publicada no dia 13 de novembro de 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no informativo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil” destacou que pretos e pardos trabalham, estudam e recebem menos do que os brancos no Brasil.

Entre os 10% com maior rendimento per capita no país, 70,6% são brancos. Entre os 10% mais pobres, a situação se inverte: 75,2% são pretos e pardos. Ademais, na classe com rendimento mais elevado, os cargos gerenciais em empresas, ou seja, aqueles que oferecem maiores salários, são ocupados por nada menos do que 85,9% de brancos. Uma diferença brutal!

É interessante notar que essa desigualdade de renda ocorre em um país onde 55,8% se declararam pretos e pardos para o IBGE em 2018, ou seja, são a maioria da população. Esse detalhe demográfico torna essa diferença na renda dos brasileiros mais injusta ainda.

Essa injustiça advém do preconceito racial, um fantasma que ainda paira sobre a atmosfera do país e tem suas origens em nosso passado escravocrata (no Brasil, a escravidão perdurou por mais de 300 anos). 


                                                      Renda e gênero


De acordo com pesquisa publicada pelo IBGE, em 2018, as mulheres brasileiras entre 29 e 49 anos de idade recebiam, em média, salários menores do que os homens brasileiros na mesma faixa etária.

Os salários delas equivalia a 79,5% dos homens. O valor da hora média trabalhada das mulheres era de R$13,00 e dos homens era de R$14,2. Uma grande injustiça se ainda considerarmos que as mulheres, geralmente, costumam estender a jornada de trabalho ao chegar em casa, para cuidar dos afazeres domésticos e dos filhos.

No dia 16 de novembro de 2019, na final do campeonato paulista de futebol feminino, travada entre os times do Corinthians e o do São Paulo, quando as corintianas fizeram o primeiro gol da partida, uma situação inusitada aconteceu: no placar, em vez do registro de 1 a 0, observou-se 0,8 a 0. 

A iniciativa fez parte de uma ação da Federação Paulista de Futebol (FPF) com a ONU Mulheres para evidenciar o fato de que as mulheres brasileiras recebem uma diferença salarial cerca de 20,5%   menor do que os homens ao exercerem a mesma função laboral. 

Esse preconceito de gênero que impõe salários menores às mulheres talvez ainda seja fruto do patriarcado social que perdurou durante muito tempo no país (condição caracterizada pela dominação masculina nas instituições políticas, sociais, econômicas e familiares) e, somente de alguns anos para cá, foi amenizado frente a uma nova configuração da família brasileira.

Nessa quantidade de dados estatísticos apresentados no artigo, fica claro que ser mulher, preto ou pardo no Brasil é ter uma grande chance de perceber salários menores no mundo do trabalho. E ser um “super rico” no país é uma garantia de abocanhar uma porcentagem bastante considerável da renda total percebida pelos brasileiros.

Essa diferença de renda é mais uma nuance da desigualdade social brasileira, um problema histórico que sempre assolou o país, que sempre marcou uma sociedade forjada no colonialismo, na crueldade da escravidão, no enorme fosso existente entre a “Casa Grande” e a “Senzala” e no muro quase intransponível que separa os ricos dos pobres.

Essa diferença de renda é consequência do racismo estrutural, do preconceito de classe e de gênero existentes no bojo da sociedade brasileira.

Que não achemos normal essa absurda desigualdade de renda em um país tão rico, mas tão desigual e tão injusto como o Brasil.

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