Aprendi há muito tempo a escrever, antes do dia primeiro de janeiro de cada ano, uma lista de meus objetivos para o novo ano. Também, periodicamente, reler os objetivos lançados e analisar se tudo está caminhando para que sejam alcançados.
Você lembra quais eram seus objetivos para o ano que está terminando? Quais deles conseguiu concretizar? Quais não foram possíveis? Para os que não foram, conhece as razões de não os ter alcançados?
Sabemos que entre a teoria e a prática existe uma grande distância. Falar é fácil, fazer nem tanto. Mesmo assim, muitas coisas foram criadas com o método da tentativa e erro. Assim, quando a teoria não funciona na prática, é fundamental fazer uma análise, ao final do ano ou de certos períodos, com o objetivo de encontrar onde está ou estão as falhas que o impediram de conquistar os objetivos alvejados.
Pensando nisso, lembrei-me do filme “A outra história americana” (American History X), lançado em 1998, onde o personagem Derek Vinyard (Edward Norton) busca vazão para suas agruras tornando-se líder de uma gangue de racistas. A violência o leva a um assassinato e ele é condenado pelo crime. Três anos mais tarde, ele sai da prisão e tem que convencer seu irmão mais jovem Danny (Edward Furlong), que está prestes a assumir a liderança do grupo, a não trilhar o mesmo caminho. O que nunca esqueci foi a pergunta feita por Derek ao irmão, em um dado momento do filme, que era mais ou menos assim: “tudo o que você fez até agora mudou sua vida para melhor?”
Considerando esse questionamento, podemos fazer uma análise sobre o ano que está terminando a fim de observarmos se nossa maneira de agir mudou nossas vidas para melhor. Se isso aconteceu, devemos continuar com a mesma postura. Entretanto, se essas atitudes não contribuíram para mudanças positivas, então é melhor fazermos diferente. Mas como transformar a si mesmo?
Para refletirmos sobre uma possível, e difícil, resposta a essa pergunta, já que não existe uma fórmula pronta para a resolução de problemas e dificuldades pessoais, podemos pensar no sentimento que paira no íntimo da maioria das pessoas, até mesmo dos pessimistas de plantão, nessa última semana do ano.
O limbo do calendário é a semana entre o natal e o ano novo. É como se fosse um intervalo no espaço-tempo, quando, passadas as comemorações daquele feriado, seja lá o que for que cada um comemore, há um hiato na euforia e na alegria, momento de começar a somar os gastos e contabilizar os próximos, no aguardo do suspiro derradeiro do ano moribundo. É nesse intervalo que vai surgindo o sentimento chamado esperança.
Há sempre esperança de um ano melhor, mesmo contrariando os noticiários, e de uma mudança na vida. E talvez seja esse o primeiro passo para qualquer transformação pessoal: a esperança. Assim, veio-me também à memória um texto do escritor e filósofo Mário Sérgio Cortella.
No texto ele fala que gosta de lembrar Paulo Freire, quando dizia que “’É preciso ter esperança. Mas tem de ser esperança do verbo esperançar’. Por que isso? Por que tem gente que tem esperança do verbo esperar. Esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. ‘Ah, eu espero que melhore, que funcione, que resolva’. Já esperançar é ir atrás, é se juntar, é não desistir. É ser capaz de recusar aquilo que apodrece a nossa capacidade de integridade e a nossa fé ativa nas obras. Esperança é a capacidade de olhar e reagir àquilo que parece não ter saída. Por isso, é muito diferente de esperar; temos mesmo é de esperançar.”
Se pesquisarmos a definição do verbo esperançar, veremos que é o mesmo que almejar, sonhar, buscar, agir, como dito acima. Esperançar é definir o que se quer e como irá alcançar, então, esperançar passa a ser a força que nos torna resilientes.
Diante disso, podemos concluir que antes de qualquer estratégia para mudar a si mesmo, antes de definir objetivos, antes até de começar a orar, é preciso ter esperança. É preciso sonhar e ter fé, acreditar que é capaz. Se, antes de tudo, não houver esperança e perseverança, qualquer coisa que venha depois dificilmente terá um resultado positivo.
Em uma entrevista, o Cortella falou que a tragédia não é quando o homem morre, lembrando a frase do filósofo e médico alemão Albert Schweitzer, prêmio Nobel da paz de 1952, que ele diz que “A tragédia do homem é o que morre dentro dele enquanto ele ainda está vivo.”
Por isso, ao iniciar o próximo ano, espero que sua esperança, do verbo esperançar, esteja sempre viva, que anote seus objetivos, ore por eles, persevere e em 2020 escreva uma outra história de si mesmo.
E que você tenha um feliz novo ano!