Celebramos o ano novo, mais uma vez, com esperanças renovadas. Quais são nossas esperanças para 2020, no Brasil? Os milhões de miseráveis deste país esperam pelo menos sobreviver. Porém, se dependerem da política econômica em curso, não lhes restarão muitas chances. O Estado Brasileiro, exceto em poucos períodos, jamais priorizou políticas sociais e cometerá até mesmo a crueldade de taxar o seguro desemprego, a partir de março de 2020, de quem tentará sobreviver por pouco tempo com um salário minguado.
Neste país, o pobre sobrevive graças a um “Estado Paralelo”, da solidariedade entre os próprios pobres e remediados. Esta, sim, é uma de nossas esperanças: fazermos crescer a solidariedade, a ponto de todos, neste país, entenderem a importância de nosso sistema societário tornar-se integralmente solidário. Isso significa que nosso modelo econômico deverá orientar-se pelo princípio da cooperação, pois, a atual extrema liberdade de mercado, sem responsabilidade socioambiental, gera, inevitavelmente, caos.
Vivemos em um tempo de muitas tensões sociais. Aumentam-se os conflitos, nutridos até mesmo por autoridades extremamente grosseiras, que fazem a nação toda sofrer por seus comportamentos autocráticos e abrutalhados. Os cidadãos esperam dos servidores públicos, sobretudo dos que possuem cargos eletivos, minimamente educação, sejam eles instruídos ou não. Temos direito ao respeito, que na vida pública deve traduzir-se em diálogo social e ações do Estado em favor da coletividade, jamais de interesses privados.
Os obstáculos atuais para se construir um país saudável parecem intransponíveis. No entanto, nossa esperança, renovada no início deste novo ano, inspirada na fé cristã, nos coloca no caminho de luta, cujo horizonte é de justiça e paz social. O Papa Francisco, em sua mensagem para o primeiro de janeiro deste ano, Dia Mundial da Paz, diz que ela resulta do “trabalho paciente de busca da verdade e da justiça”. O Papa é corajoso ao dizer que “nunca haverá paz verdadeira, se não formos capazes de construir um sistema econômico mais justo”.
Consciente das consequências trágicas do sistema econômico no qual estamos imersos, bem como da “nossa hostilidade contra os outros, da falta de respeito pela casa comum e da exploração abusiva dos recursos naturais, considerados como instrumentos úteis apenas para o lucro de hoje, sem respeito pelas comunidades locais, pelo bem comum e pela natureza”, o Papa propõe, também, uma “conversão ecológica”. Essa conversão implica superar a visão de “domínio despótico do ser humano sobre a criação” e de um sobre outro.
A lucidez admirável do Papa Francisco advém de sua mística profundamente cristã. Ele olha a realidade da humanidade com compaixão. A Igreja no Brasil, imbuída também desse sentimento, prepara a Campanha da Fraternidade de 2020, focando-se na vida, dom de Deus, a ser integralmente defendida. Seu lema “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele”, do Evangelho de Lucas 10,33-34, corresponde à referência feita por Jesus ao Bom Samaritano, que socorreu o ferido à beira do caminho, fazendo-se próximo e solidário.
Seguindo o exemplo do Bom Samaritano, cuja misericórdia é indicada por Jesus (cf. Lc 10,37) a quem quer ganhar a vida eterna (cf. Lc 10,25), adentremos o novo ano dispostos a expandir nossas ações em prol de um país verdadeiramente solidário, começando pelo município onde habitamos. Sintamo-nos interpelados a contribuir, especialmente neste ano eleitoral, com o projeto de uma nova sociedade, na qual a participação cidadã organizada em defesa da vida, sobretudo dos socialmente excluídos, seja prioridade máxima.