Por Gil Piva
Crítica
*** BOM
Para o filósofo, o mundo moderno não passa de uma panfletária atuação, efêmera e insuficiente
Sem papas na língua, mas com ácidos argumentos que fazem do pensamento do professor, filósofo e escritor Luiz Felipe Pondé, uma figura controversa tanto no mundo acadêmico e intelectual quanto num espaço de leitores mais incultos, a que aliás se destina. É sempre neste tom que Pondé avança pelo debate (ou ensino) da Filosofia. Doutor pela USP com suporte complementar pela Universidade de Paris, e com pós-doutorado na Universidade de Tel Aviv, ele vagueia com propriedade pelos mais diversos assuntos, desde política à religião.
Esmiuçando de forma ágil o pensamento contemporâneo, Pondé ousa em seus ensaios uma espécie de revisão das tradições comportamentais, chegando a sugerir que o mundo moderno não passa de uma panfletária atuação, efêmera e insuficiente. Assim tem sido com seus principais livros: Contra um Mundo Melhor: Ensaios do Afeto (2010), Guia Politicamente Incorreto da Filosofia (2012) e A Era do Ressentimento: Uma Agenda para o Contemporâneo (2014). Lançado em julho, seu último trabalho, Filosofia para Corajosos: Pense com a Própria Cabeça, segue a mesma trilha e a mesma inflexão. Pode-se, de novo, notar as influências diretas de Pondé (Freud, Sartre, Nietzsche, Edmund Burke, Cioran, Oakeshott, Santo Agostinho, Pascal e Nelson Rodrigues), dando-lhe o embasamento necessário para manter sua irônica e pessimista saga reflexiva.
Uma das grandes facetas de Pondé é a de se declarar honesto ao leitor: “Escrevo para quem deseja falar sua própria língua em filosofia, e o primeiro passo é não ter medo do que pensamos em silêncio, apesar de termos medo de dizer em voz alta”. Neste ponto, desnudar a ordem do silêncio é uma transgressão que beira, vale lembrar, uma responsabilidade perigosa.
Noutro trecho, como prova de seus efeitos retóricos, enfatiza que “Uma certa leveza de espírito é necessária ao cético; do contrário, ele pode virar uma adolescente boçal que acha que é a primeira pessoa inteligente na face da Terra”. E no capítulo “Deus Existe?” modula com audácia “sádica” a sensível e conflituosa imagem de um Deus eterno: “me parece misterioso e interessante de conhecermos, ainda mais de for uma ‘pessoa’. Qualquer um de nós no lugar Dele já teria se matado. Ninguém suportaria a eternidade e tanto conhecimento acumulado...”
Infelizmente, para quem acompanha parte da trajetória de Pondé — que também mantém uma coluna no jornal A Folha de S. Paulo — descobrirá logo pela metade do livro que seus temas e investigações muitas vezes repousam na rotina de ideias, conceitos e conclusões repetitivas.
Embora Pondé, noutra ocasião, tenha se defendido de maneira decisiva sobre essa questão, alegando que para que o ensinamento seja de fato eficaz precisa ser redundante, em nada modifica a sensação de que o estado frequente em que se expressa o autor pareça perder o diapasão no qual a percepção da filosofia se ancora.
Dizer a verdade trata-se de uma condição autêntica — por não desejar se suprimir —; porém permitir que essa autenticidade não vá muito longe, uma liberdade experimentada a baixo custo, significa sujeitá-la a um novo tipo de isolamento.
Excetuando isso, no domínio da vida comum, Pondé acerta no alvo as batatas para quem se definha sozinho e sistematicamente na arte de pensar.
FILOSOFIA PARA CORAJOSOS: PENSE COM A PRÓPRIA CABEÇA
Autor: Luiz Felipe Pondé
Editora: Planeta
(192 págs.; R$ 34,90)