LITERATURA

Mario Vargas Llosa nos limites policialescos e políticos

Mario Vargas Llosa nos limites policialescos e políticos

Em novo livro, Cinco Esquinas, o Nobel de Literatura elabora uma crítica política à imprensa marrom e ao uso que o governo Fujimori fazia dela

Em novo livro, Cinco Esquinas, o Nobel de Literatura elabora uma crítica política à imprensa marrom e ao uso que o governo Fujimori fazia dela

Publicada há 8 anos

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Llosa constrói seu texto com o risco de as entrelinhas se projetarem sobre suas próprias desconstruções



Por Gil Piva



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CINCO ESQUINAS

Autor: Mario Vargas Llosa

Editora: Alfaguara

(213 págs.; R$ 49,90)



Bem que o título do novo romance do escritor peruano, vencedor do Nobel,Mario Vargas Llosa,poderia se chamar Quem matou fulano de tal?, uma referência a outro livro seu, de estilo similar, publicado no ano 1986: Quem matou Palomino Molero?. Um pouco da diferença entre ambos está já na antecipação, ou seja, no seu romance maisantigo o leitor já de cara percorre por uma trilha policialesca sabendo de antemão quem é a vítima.


Embora em seu novo romance Cinco Esquinas as coisas não se deem bem assim,tampouco demorem muito para uma chaminé funesta de um assassinato entrar em cena. Daí em diante,talvez com menos mistério, questões são levantadas a respeito da morte e dos possíveis suspeitos. Há de se levar em conta que Llosa é um exímio contador de histórias; para qualquer trama, isso é mais que suficiente.


Cinco Esquinas é o nome de um bairro antigo do Peru. E, assim como essa antiguidade, funciona o próprio efeito de se usar o thriller. Então, neste caso, para um leitor desatento, que aguarda ansioso página após página enigmas mirabolantes ou intrigas sofisticadas, entrefalas e debates calorosos, pode emergir certa frustração. Mas Llosa, hábil escritor,não perde a mão nem a intençãoinicial. O thriller escorrega contaminado por uma distorção: elaborar uma crítica política à imprensa marrom e ao uso que o governo Fujimori fazia dela.


Portanto, Llosa extrai essencialmente do estilo o que precisa para expor um período histórico, que de tão irracional possuía o tom de literatice, uma ficção moldada pelo léxico ditatorial.


Para quem não sabe, a vida intelectualde Llosa sempre gerou desavenças e incompreensões. Em 1990, concorreu à presidência, como candidato da centro-direita(Partido Frente Democrática), e foi derrotado por Alberto Fujimori, no segundo turno. Logo após as eleições, Llosa deixouo país e muitos compatriotas até hoje não o perdoam por isso. Recentemente,Llosa chamou o candidato Donald Trump de“palhaço racista”.


Bem ou mal, seus princípios não se desvencilham do lado político da vida. E Llosa constrói seu texto nesse ínterim, com o risco de as entrelinhas se projetarem sobre suas próprias desconstruções; afinal, como tudo é antigo, tudo pode ser vago e também abstrato. 


Cinco Esquinas, sem dúvida, não é um dos melhores romances do escritor, mas tem uma força romântica, destilada não só pelas prejudiciais preferências e tendências que se guardam no passado remoto ou não, como também por embalar uma condição de quem jamais esqueceu os entre atos encravados de seu país.


Se em 1990 Mario Vargas Llosa perdeu as eleições para Alberto Fujimori, este,por sua vez, foi derrotado numa outra esfera,na qual os costumes retratam o benefício de um bom livro e as voltas de uma renovada liberdade de expressão. Ponto paraa sociedade peruana. Entre a esfera policial e a política, há a trivialidade do limite entre os dois — pois a seriedade de um grande autor e o registro de uma boa narrativa não sucumbiram à monstruosidade ritualística de poder.

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