A próstata ocupa um dos principais alvos de câncer. Para o ano 2020, foram estimados 65.840 de novas incidências de câncer de próstata (CaP). Considerando-se a distribuição proporcional dos dez tipos de câncer de maior ocorrência em 2020, o câncer de próstata alcança 29,2% da população masculina, enquanto o câncer de colo e reto aparece com 20.520 (9,1%) dos casos (INCA, 2019). A idade é um “fator relevante para tal agravo, aumentando sua incidência na quinta década de vida” (INCA, 2017). É o único fator de risco bem estabelecido para a insurgência do câncer de próstata: cerca de 75% de todos os pacientes com a doença no mundo já passaram dos 65 anos de idade (SOUSA, 2017), sendo raro em homens com idade inferior a 40 anos, mas aumenta após os 50 anos. É considerado de terceira idade (INCA, 2021).
A próstata é uma glândula do sistema reprodutivo masculino. Situada abaixo da bexiga, à frente do reto, envolve a parte superior da uretra (canal para passagem da urina). Tem a função de eliminar a urina acumulada na bexiga e responde pela produção do sêmen, líquido espesso que contém, nutre e protege os espermatozoides liberados pelo canal uretral durante o ato sexual (INCA,2017). Embora seja uma “doença comum, por medo ou por desconhecimento, muitos homens preferem não conversar sobre esse assunto” (INCA, 2017, p. 5), ou por preconceito e constrangimento deixam de realizar o exame do toque retal e da dosagem de Antígeno Específico Prostático (PSA), fundamentais para a detecção precoce da neoplasia (SOBRAL, 2020). Dependendo dos achados, a ultrassonografia e outros exames de imagem e biópsia de próstata são sugeridos (INCA, 2013).
Mais de 95% dos casos de câncer de próstata são do tipo adenocarcinoma e surge devido à proliferação descontrolada das células. A maioria dos casos cresce de forma lenta (15 anos para atingir 1 cm³) e não chega a apresentar sinais nem ameaçar a saúde do homem (SOBRAL, 2020; INCA, 2021). Vale destacar que, como consequência de uma cultura machista, por medo e vergonha (SILVEIRA; MELO; BARRETO, 2017), os homens não buscam “atendimento em saúde, pois o modelo hegemônico de masculinidade [...] dificulta que eles tenham atitudes direcionadas para o autocuidado” (GARCIA; CARDOSO; BERNARDI, 2010, p. 27).
Embora a idade represente o fator principal, não é o único fator de risco para o câncer de próstata. Outros fatores se seguem: tabagismo associado a álcool, obesidade, herança ou alteração genética (histórico familiar), dieta, etnia afrodescendente, inflamação da próstata ou lesões malignas não modificáveis (INCA, 2021). Atitudes preventivas podem reduzir a incidência do câncer de próstata: alimentação equilibrada, prática regular de atividade física e hábitos de vida saudáveis.
A maioria dos sinais ou sintomas mais comuns estão associados ao ato de urinar: aumento de diurese, dificuldade para urinar, interrupção involuntária, dor ou ardência, jato mais fraco, sensação de bexiga não esvaziada, urina ou esperma com sangue (INCA, 2017). O paciente com diagnóstico de CaP tem sua vida alterada e tem de enfrentar diferentes fases da doença: diagnóstico, tratamento e reabilitação psicossocial das sequelas do tratamento (SOUSA et al., 017). Por localizar-se em posição anatômica responsável pelas funções sexuais do homem, é comum que desencadeie conflitos relacionados à sexualidade. Na fase de tratamento, emerge a esperança de cura ou, ao contrário, causa medo e insegurança de não a alcançar (MOSCHETA; SANTOS, 2012).
O câncer de próstata é uma doença que determina importante impacto no cotidiano dos homens afetados e em sua qualidade de vida, com alterações profundas e drásticas em suas vidas (MOSCHETA; SANTOS, 2012). O diagnóstico de câncer, doença grave geralmente associada à morte, desencadeia forte impacto psicológico, “marcado por sentimentos de angústia, medo, tristeza edesespero”, associado à raiva, revolta, impotência, frustração e fracasso (TOFANI; VAZ, 2007), e à percepção de “que a necessidade de afastamento das suas atividades laborais e os reflexos do tratamento na sexualidade contribuem para sensação de redução e perda da masculinidade” (QUIJADA et al., 2017, p. 2496).
Pacientes com câncer de próstata estão sujeitos a uma incidência maior de depressão, sendo a sexualidade um fator expressivo de preocupação. O sofrimento “afeta seu bem-estar físico e emocional, assim como a qualidade de vida em geral” (TOFANI; VAZ, 2007, p. 197). Neste âmbito, a rede de apoio composta por amigos e familiares deve ser fortalecida e direcionada à aceitação da doença e ao manejo dos sentimentos, e uma avaliação psicológica é importante instrumental coadjuvante do diagnóstico médico associado ao exame psicodiagnóstico.
A notícia da presença de câncer é um gatilho para naturalizar a dor e o sofrimento por meio de medidas de isolamento, racionalização (mecanismos de defesa), e resistência para amenizar os impactos; é comum o paciente manifestar sintomas depressivos e medos do isolamento e da morte, sendo os mecanismos de defesa formas de evitar a angústia suscitada pelo assunto. O psicodiagnóstico considera os sentimentos de auto piedade ou pessimismo, angústia e depressão, insônia e redução de contatos sociais, fadiga, perda de reatividade e dificuldade de se animar (MACEDO NETO, A. J.; GRANADO, L. C.; SALLES, 2020). Recomenda-se remover a dor antes de consolidar o diagnóstico psicológico nem se deve negar uma rede social de apoio, “já que pessoas com estrutura psíquica frágil, em geral têmdificuldade em estabelecer uma rede de apoio significativa” (TOFANI; VAZ, 2007, p. 198).
O procedimento cirúrgico de prostatectomia (retirada da próstata) parcial ou radical tem efeitos devastadores devido à agressão da integridade física, emocional e social do sujeito, e efeitos colaterais como disfunção sexual, incontinência urinária e inibição ou desmotivação ao convívio social. Diante dessa realidade,o papel do psicólogo é “considerado fundamental no período pré-cirurgia, desmistificando crenças limitantes e esclarecendo dúvidas do paciente” (NOVAK; SABINO; COELHO, 2015, p. 16), ou no período pós-cirúrgico, quando cuida de reabilitar o paciente e propor uma rotina saudável, manejo adequado de situações de ordem física e emocional, psicoeducação e auto percepção corporal.
É imprescindível a mudança na mentalidade da populaçãomasculina, que deve aceitar a execução de hábitos rotineiros relacionados ao autocuidado(SILVEIRA; MELO; BARRETO, 2017), mas também é relevante que os profissionais de saúde estejam capacitados para, dentro do contexto cultural dos homens, atender as demandas desse público.
Modesto et al. (2018) lembram que, no Brasil, uma campanha, iniciada em 2008, recebeu o nome “Novembro Azul” em 2012. A campanha contempla questões relacionadas à saúde da população masculina, cujo foco principal é o câncer de próstata. Visa rastrear o câncer de próstata e reúne diversos atores acentuando uma intervenção corriqueira para profissionais e usuários e ampliando o interesse na saúde dos homens, buscando a conscientização dessa população sobre a doença e a parceria da medicina com a prevenção em geral.
REFERÊNCIAS
GARCIA, L. H. C.; CARDOSO, N. O.; BERNARDI, C. M. C. N. Autocuidado e adoecimento dos homens: uma revisão integrativa nacional. Revista Psicologia e Saúde, v. 11, n. 3, p. 19-33, set./dez. 2019.
INCA – Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Rastreamento do câncer de próstata. Rio de Janeiro: INCA, 2013.
______. Câncer de próstata: vamos falar sobre isso? Rio de Janeiro: Inca, 2017. 12 p.
______. Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2019. 120 p.
______. Tipos de câncer: câncer de próstata [Internet]. [Última modificação em: 24/08/2021]. Rio de Janeiro: INCA, 2021. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-prostata. Acesso em: 9 nov. 2021.
MACEDO NETO, A. J.; GRANADO, L. C.; SALLES, R. J. Compreensão das atitudes diante do diagnóstico de câncer de próstata no processo psicodiagnóstico interventivo. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 66-80, jan./jun. 2020.
MODESTO, A. A. D. A.; LIMA, R. L. B.; D’ANGELIS, A. C.; AUGUSSTO, D. K. Um novembro não tão azul: debatendo rastreamento de câncer de próstata e saúde do homem. InterfaCe Comunicação Saúde Educação, v. 22, n. 64, p. 251-262, 2018.
MOSCHETA, M. S. M.; SANTOS, M. A. S. Grupos de apoio para homens com câncer de próstata: revisão integrativa da literatura. Ciência & Saúde Coletiva, v. 17, n. 5, p. 1225-1233, 2012.
NOVAK, J. C. N.; SABINO, A. D. V.; COELHO, G. G. C.Efeitos psicossociais da prostatectomia radical em pacientes com câncer de próstata. Arq. Ciênc. Saúde, v. 22, n. 3, p. 15-20, jul./set. 2015.
QUIJADA, P. D. S.; FERNANDES, P. A.; OLIVEIRA, D. S.; SANTOS, B. M. O.Câncer de próstata: retrato de uma realidade de pacientes em tratamento. Revenferm UFPE, Recife, v. 11, supl. 6, p. 2490-2499, jun. 2017.
SILVEIRA, C. L. G.; MELO, V. F. C.; BARRETO, A. J. R. Atenção à saúde do homem na atenção primária em saúde: revisão integrativa. J Nurs UFPE, Recife, v. 11, suppl. 3, p. 1528-1535, mar. 2017.
SOUSA, W. L.; LIMA, C. B.; MENEZES, P. C. M.; FRANÇA, E. M. D. M. Assistência de enfermagem na prevenção da neoplasia de próstata: uma revisão na literatura. In: LIMA, C. B. (ed.). Temas em saúde. João Pessoa, v. 7, n. 4, 2017.
TOFANI, A. C. A.; VAZ, C. E. Câncer de próstata, sentimento de impotência e fracassos ante os cartões IV e VI do Rorschach. Interam. j. psychol., Porto Alegre,v. 41,n. 2,p. 197-204, ago.2007.
SOBRAL, D. L. A.Câncer de próstata: um agravo para a saúde do homem.Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, ano 5, v. 11, n. 6, p. 102-113, jun. 2020.