ARTIGO

Memórias afetivas

Memórias afetivas

Por Carlos Eduardo Maia de Oliveira

Por Carlos Eduardo Maia de Oliveira

Publicada há 1 ano

Outro dia um amigo, entusiasmado, enviou-me um vídeo pelo celular mostrando a sua mãezinha, de 85 anos de idade, preparando um prato que o despertou para recordações de sua infância.

No vídeo, ele me perguntava se conhecia aquela iguaria. Não reconheci, mas isso passou a ser secundário naquele instante, pois fiquei admirando aquele singelo acontecimento.

Acontecimento que me levou a pensar que toda pessoa tem boas lembranças de sua infância e, geralmente, são momentos simples e vivenciados em família ou entre amigos.

Mas vamos às recordações que, tenho certeza, muitos leitores irão se identificar! Cheirinho de café invadindo o nosso quarto pela manhã quando éramos crianças e nossas mães deixavam a mesa pronta antes de partirmos rumo à escola. Aroma de bolinho de chuva sendo fritado em uma tarde chuvosa, biscoito de polvilho, pipoca ou batatinha faziam a nossa alegria. Aquele doce na vendinha da esquina garantia a nossa felicidade.

Quem nasceu nas décadas de 1970 ou início de 1980, deve se recordar do odor forte de cera que nossas mães passavam no chão espalhada pela velha enceradeira (um eletrodoméstico que costumava dar choque).

E por falar em choque, e aquelas geladeiras antigas, hein? Tínhamos medo só de encostar na maçanete antes de abri-las. Não existiam modelos duplex, triplex, “frost free” ou assemelhados. No congelador formavam-se crostas de gelo. Elas não possuíam grande variedade de cor. Eram disponíveis nas cores azul-clara, vermelha, amarelo-clara, branca, não muito mais do que isso. Atualmente, existem pequenos frigobares inspirados no “design” e na cor delas vendidos nas lojas físicas ou virtuais pela internet.

Os eletrodomésticos e utensílios também fazem parte da nossa infância, por isso lembrei-me da geladeira antiga e das velhas enceradeiras. Além delas, aqueles liquidificadores barulhentos, aparelhos de televisão que insistiam em não estabilizar a imagem (nossos pais ficavam girando a antena e perguntando se a imagem tinha melhorado) e aparelhos de som que rodavam discos de vinil e fitas cassete, caríssimos na época (era ostentação ter um deste em casa).

Também tinham os fogões com apenas quatro bocas (acendimento automático nem no sonho), filtro de barro daquela marca famosa fabricada na cidade de Jaboticabal, o velho rádio na cozinha e o carrinho com bebidas na sala de visita (hoje em dia, muitas casas nem possuem mais este cômodo porque quase não recebemos visitas em casa – triste fato!). 

Cabem destacar aqui duas verdades sobre os eletrodomésticos e utensílios presentes em nossa rotina na infância: duravam pra caramba (os atuais são quase descartáveis) e nos trazem recordações pitorescas.

Vejam que recuei algumas décadas para tirar do baú estas recordações, no entanto, os mais experientes poderiam me lembrar do pote de barro, da moringa de água feita de cabaça (útil na roça), do velho fogão a lenha, do forno de barro para assar pães, do ferro de passar roupas movido à brasa, da carne de porco conservada na gordura dentro daquelas latas prateadas (não tinham geladeiras), pamonha preparada no quintal juntamente com os amigos e familiares e outras peculiaridades que faziam parte da rotina de quem morava na zona rural, principalmente.

Cheiro de pão de queijo, pão feito em casa, de pipoca no sábado à tarde, macarrão aos domingos, eletrodomésticos rústicos de época, da prateleira antiga, enfim, tudo isso nos traz boas recordações de uma vida simples e feliz. Lembranças de um tempo que não volta mais.

Ah, já ia me esquecendo! Afinal de contas, qual era o prato que a mãe do meu amigo preparou para ele naquele dia? Eu não acertei de jeito nenhum, tive que esperar ele responder. E a resposta foi miolo bovino frito, uma iguaria que despertou em meu amigo boas recordações, lembranças da sua infância vivida no sítio, memórias afetivas. E quem não as têm?

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