Já estou aqui no bar há uma hora observando-a. Ela olha para a TV acompanhando a novela enquanto seus dedos roçam a base da taça com a sua bebida pela metade. A noite toda eu a estudei pensando em como me aproximar. Ela entrou e foi direto ao balcão pedir a bebida. Tocou no celular duas vezes. Uma para atender uma ligação e outra para responder a uma mensagem. Em ambos os casos seu estado mental não pareceu se alterar. Não olhou para o relógio nem aparenta esperar alguém. Tampouco foi ao banheiro, nem para retocar a maquiagem (coisa de que ela não precisa). Pareço um adolescente. O que falo com ela? Como manter o assunto? Essas perguntas parecem mais difíceis agora que a minha namorada terminou comigo depois de três anos. Procurar uma pessoa após tanto tempo parado é complicado. Quer saber? Já estou cansado de ficar aqui parecendo um vigia. Vou falar com ela da novela, pergunto por que ela está só ou o raio que o parta. Levanto e vou até ela, quando um cara toma a dianteira e se encosta ao lado dela dizendo: — Oi. Você vem sempre aqui? Ela se desmancha em um sorriso e começa a falar com ele. Eu não acredito! Esse foi o xaveco que Adão usou em Eva, e ela caiu! Vou pisando duro até a porta do bar e abro-a com força, assustando uma mulher que ia entrar. Ficamos olhando um para o outro até ela dizer: — Oi. E eu, sem graça, respondo: — Ahn... é... oi. E hoje, depois de um uma amizade que culminou em um namoro e passou a ser um noivado com data de casamento marcado antes que o nosso primeiro filho nascesse, vejo que valeu a pena esperar aquela noite toda.
* DAVI PAIVA É PROFESSOR DE CURSINHO PRÉ-VESTIBULAR E ESCRITOR