Crônica: O último parágrafo - A 'história' da mulher que moldava frases

Crônica: O último parágrafo - A 'história' da mulher que moldava frases

Leia também: Virá um dia - Por: Bezerra de Menezes

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Publicada há 2 horas

Minutinho: Virá um dia

Por: Bezerra de Menezes

(...) Virá um dia em que a criatura humana esquecer-se-á de si mesma e, naturalmente quando chegue esse dia, que não está longe e não está perto, as criaturas humanas se abraçarão carinhosamente.

Virá um dia em que o lobo feroz beberá no mesmo regato do cordeiro.

Um dia virá em que as criaturas estreitarão os corações numa doce afetividade.

Virá um dia em que o Santuário dos Espíritos agasalhará a misericórdia de Deus deixando de ser um clube para ser um altar da natureza.

Virá um dia em que nos amaremos uns aos outros com ternura e ciciaremos aos ouvidos palavras doces de encantamento.

Virá um dia em que o amor conseguirá superar o ódio e a amargura.

Filhas e filhos do coração, o Senhor convocou-nos para a implantação do Seu Reino nas paisagens lúgubres da Terra, nos lugares escusos em que a dor se homizia e a vergonha marca com sinete de fogo os corações derrotados.

Haja o que houver, amai! A honra do amor é daquele que ama. Estendei as mãos da caridade, deixai que o amor penetre pelo cérebro, desça através da voz e caminhe pela ternura das mãos, brilhando no coração como o do crucificado que cheio de sangue nos convidou à redenção.

Não amanhã, hoje. Não mais tarde, agora é o momento santo de ajudar.

Exultai vós que chorais. Aqui estamos aqueles que vos amamos para vos dizer, suavemente - vinde, nós vos esperamos. Vinde para fluirmos da mercê e ternura do Amor não amado: “Vinde, e eu vos consolarei!”

Filhas e filhos da alma, voltai aos vossos lares e amai ao próximo mais próximo de vós - a família. Honrai-a com os vossos beijos de carinho e amai enriquecendo de vida os que estão sedentos de amor e esfaimados de compreensão.

Jesus espera por nós.

Eia, o instante azado da nossa integração no Espírito do Cristo!

Muita paz.

Exoramos a Deus que a todos vos abençoe e vos abraçamos em nome dos Espíritos- espíritas que aqui estamos.

Crônica: O último parágrafo

Por: Proença

Durante anos, ela viveu de palavras. Moldava frases igual artesão esculpe madeira: com paciência, com dor, com alma. Seus personagens tinham peso; seus silêncios, voz; suas histórias, carne.

Podia-se dizer que seus escritos produziam algo nutritivo à alma. Não continham apenas pão. Havia bife no interior daqueles sanduiches ensandecidos.

Era escritora; dessas da antiga, que escrevem mesmo quando ninguém lê.

Ela não lembrava do seu nome anterior, mas às vezes sonhava com lugares que nunca visitou: uma vila à beira-mar onde o vento trazia cheiro de sal e tristeza.

Diziam que reencarnação era crença dos que têm medo do fim. Mas para ela era esperança dos que já viveram demais. Algo dentro dela sussurrava que o tempo não era uma linha reta, mas um círculo.

Na vida atual, buscava sentido nos encontros: nas amizades instantâneas, nos olhares que duravam um segundo, mas carregavam séculos. Acreditava que tudo tinha um porquê, mesmo que esquecido; que enterrado na poeira de outra existência.

Talvez tivesse sido mãe, guerreira, poetiza ou algo mais simples: uma lavadeira que cantava à beira do rio. Não importava.

No fundo, ela sabia: a morte não era um fim. Era só intervalo entre dois atos; e a alma, essa inquieta viajante, sempre encontra o caminho de volta ao palco da vida.

E era na literatura que encontrava uma maneira de deixar a crença metafísica se tornar uma engrenagem sensível e poderosa. Ao criar personagens que retornam em diferentes épocas, em corpos distintos, mas com fragmentos de alma que resistem ao tempo, ela desenhava uma tapeçaria emocional que atravessava séculos e, nessa travessia compartilhada com os leitores, contava a sua própria história que estava ali encoberta na intimidade do inconsciente.

Mas o mundo mudou. Vieram as máquinas. Rápidas, incansáveis, versáteis. Produziam contos, ensaios, romances em segundos. Sabiam imitar estilos, repetir fórmulas de sucesso, prever gostos. E o que antes era arte virou algoritmo.

Ela resistiu. Tentou provar que alma não se programa, que há coisas que só o humano compreende: a hesitação do amor, a culpa silenciosa, o vazio de uma perda. Mas as editoras se renderam aos dados, os leitores aos atalhos. Sua voz, outrora buscada, tornou-se obsoleta; lenta demais, profunda demais.

Com o tempo, não havia mais por quem escrever. Nem para quê. Restou-lhe apenas o silêncio e uma folha em branco, onde escreveu, sem pressa, seu último parágrafo. Não para um leitor, não para um algoritmo. Para si mesmo.

O texto é de livre manifestação do signatário que apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados e não reflete, necessariamente, a opinião do 'O Extra.net'.

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