Devo confessar que muitos assuntos me rodearam nessas últimas semanas. Mas no fim, o tempo, ou melhor, a falta de tempo, me impediu de manter a frequência dos textos.
Foi um horror, e a tristeza de muitos.
Entre os assuntos que me instigavam, estava o assassinato de Charlie Kirk. Queria escrever sobre seus argumentadores, eleitores da extrema direita, que se deleitaram com a oportunidade orgástica de mostrar que a “ponta da violência” da esquerda não dá mais para ser disfarçada.
Enquanto isso, o Beto do jornal me cobrando, cada vez mais impaciente. Entendo sua posição. As trocas simbólicas de valores levam a isso: compromissos mútuos.
De igual maneira, eu era esmagado pelo desejo de comentar a suspensão de Jimmy Kimmel da TV, e de como os pincéis ideológicos dos paladinos da liberdade de expressão repetem o erro dos seus opositores.
Esforço irrealizável para esses dias.
Os leitores encheram a caixa de e-mail do Extra. Não admitiam meu sumiço sem explicação. “Pelo menos o Reinaldo Azevedo esclareceu seu afastamento”, registraram alguns dos assinantes indignados. Calma pessoal, paciência. Agradeço todas as mensagens; sou filho de Deus e mereço descanso às vezes.
E por falar em Deus, a Câmara de Salvador-BA aprovou um projeto de lei que responsabiliza e pune com multa (Ah! bom, multa é só um gesto de resistência, jamais de censura) quem praticar cristofobia. Minha nossa! A idade média nunca esteve tão presente.
Em um trecho, a prefeitura alega que “pessoas físicas ou jurídicas condenadas judicialmente por crimes de intolerância religiosa não serão contratadas com recursos públicos”. Pergunta: religiosos que foram intolerantes com outros religiosos – ou com qualquer cidadão – segundo esta lei, é redundância, pleonasmo ou eufemismo?
Em meio a tudo isso, eis que, para surpresa da nação, Bolsonaro foi condenado.
São muitos os assuntos.
Perdi o auge do momento. Mil perdões, Beto. Sei que seja qual for o texto mencionando a condenação do Bolsonaro, tem grande repercussão. Pode confiar, no dia de sua prisão estarei gastando todo o vernáculo.
Dias antes, um colega me provocava. Ele me enviava um vídeo (antigo) em que o entrevistado destruía a filosofia marxista por meio de detalhes históricos e biográficos da vida “autocondenatória” de Marx. Percebo o ponto: cobra-se coerência entre o que se faz e o que prega. Justo!
Outro texto perdido.
Meu colega me toma por esquerdista. Melhor não contrariar. Também prefiro os homens coerentes. Se levarmos à risca essa ideia, não sobrará nenhum pilar da cultura moderna.
Devolvo a ele a questão: “Você, católico assíduo, deveria, então, abandonar a Igreja? Tantas mortes e perseguições passadas não invalidariam as manifestas obras de hoje, impulsionadas pelas mensagens de virtude e do sagrado, combinadas com noção de caridade e do perdão pela fé?” Claro que ele não respondeu. Claro que não se desvinculará da Igreja. Não acho que deva abandoná-la. E claro que ele insistirá em perseguir Marx e em me chamar de marxista. Há coisas que não mudam: as incoerências.
Meu e-mail também se encontrou repleto de mensagens pedindo que eu voltasse logo. Alguns leitores estavam preocupados; outros aliviados. Não dá para agradar a todos.
Educação. Minha mulher com frequência pede que eu escreva a respeito. Digo que não gosto. É o caso: a educação – e boa parte dos educadores – me sufoca porque ela aprendeu a se inutilizar, de modo que minha motivação reflexiva a respeito se tornou, por osmose, contagiada.
Continuo. Queria estabelecer relações entre o filme A Sociedade dos Poetas Mortos e as ideias mortas dos professores. Calma, respire, leitor. Sem dúvida endosso a educação como uma das colunas fundamentais da sociedade. E sim, sim, professores, vocês trabalham muito e bem. E sim, sim, são profissionais pouco valorizados. As ideias mortas de que trato estão no fato de a maioria não ser capaz de oferecer, em um campo amplo do debate educativo, satisfatórias análises sociais e culturais.
Aqui entraria a relação com o filme do Robin Williams. Vale a pena uma prévia, pois a analogia é óbvia: esses educadores e educadoras que choraram durante o filme e receberam uma formação pedagógica pelo filme, agem hoje parecidos com a postura totalizante que o sr. Keating, personagem de Williams, criticava com sabedoria (quase) notável à época.
São muitas as lições de comportamentos totalizantes exercidos na prática docente atual. Correção: a vaidade individual reconhece na referência simbólica da profissão uma identificação; a profissão preenche a falta que existe no ego, transformando o caráter docente em uma função totalizante (do desejo).
Duas ilustrações ainda cabem aqui. Primeiro, o ambiente escolar era para ser o berço da democracia. Em tese. Enrubesço ao pronunciar esta sentença. Em geral, o ego dos professores não aceita críticas, embora critiquem a todos e a tudo. Os que se dizem liberais, em defesa do indivíduo, se rendem aos tentáculos da escola – um tipo de Estado Máximo entre muros –, cobrando sempre mais e mais obrigações e decisões do executivo – exatamente o oposto do pensamento liberal.
Segundo, as paixões morais e de fé, por exemplo, e as posições ideológicas (partidarismo político) tornam alguns professores radicais porque não compreenderam que lugar de oração não é na escola, o que significa a derrota do Estado laico – consolidando, neles, o viés unilateral, por ignorarem o diálogo e suas múltiplas perspectivas.
Por favor, leitores, não deixem que o jornal me demita.
Prometo que meu próximo texto chegará a tempo. Virá para pôr e contrapor, como esperam que eu faça – inclusive os que não simpatizam com minhas proposições.
Até!
Gil Piva
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