Sérgio Piva

Deserto

Deserto

Sérgio Piva

Sérgio Piva

Publicada há 6 anos

Às vezes fugimos do silêncio para não ouvirmos nossos barulhos interiores. Deixamos nossos olhos constantemente ocupados para não vermos nossas entranhas.


Tentamos, invariavelmente, fugir da dor, dos momentos que perturbam nossa paz interior, do sentimento de deserto que oportunamente assolam nossas existências.

A figura emblemática do deserto aparece em muitos textos que se propõem ao ensinamento ou à reflexão. Uma imagem que faz analogia às circunstâncias e aos sentimentos que podem assolar nossas almas em determinados momentos da vida.

A imagem de uma caminhada no deserto exprime interiormente a busca de um lugar ou situação melhor do que a do vazio que essa paisagem representa ou mesmo do castigo físico e mental que ela provoca. A areia sob os pés pode simbolizar a dificuldade da nossa caminhada, por mais força que façamos, parece que não estamos saindo do lugar, agarrados por grãos minúsculos que, aos milhares, alcançam uma força monumental. 


Na jornada fatídica buscamos ao menos um oásis para um refresco momentâneo, um descanso e um recompor das energias. No entanto, o oásis periga, às vezes, ser apenas uma miragem a nos levar para o interior do nada, ao invés de nos conduzir ao refrigério momentâneo, nos desviando da rota rumo à saída da solidão.

Mas o deserto, por seu inabitado vazio, é o lugar onde encontramos com nós mesmos, com nossos pensamentos, nossas angústias, dúvidas e incertezas. É o lugar para a reflexão, de você,a sós, consigo mesmo. A imensidão externa pode proporcionar o encontro da exatidão interna.


Também é a oportunidade de elevar o pensamento e imaginar a dimensão da área do deserto. Olhar de fora para dentro torna mais claro a dimensão do deserto, ou no caso de nossa metáfora, o tamanho do problema, do sofrimento, da dificuldade.

A solidão momentânea não é de todo ruim. É, em muitos casos, necessária ao aprendizado, desde que consigamos encontrar nosso“eu”, encarando nossos pensamentos, enfrentando o medo e buscando a coragem inerente a todos os seres humanos.


O deserto pode ser um lugar abrasador e cheio de perigos, mas também é o lugar de refúgio, provação, inspiração, visão, oásis. Precisamos fazer dele apenas um trecho do nosso caminho quando cruzarmos com sua paisagem. Ele faz parte de nossa vida, mas não deve ser todo o nosso caminhar. Olhemos a estrela que consegue nos guiar para fora dele, depois de atravessarmos as areias pesadas e sentir na pele o sol escaldante.


Sigamos a vida com suas paisagens percebendo e sentindo as nuanças de cada terreno e aproveitando beneficamente, ao máximo,aquilo que cada uma delas nos proporciona.


Finalizando, reproduzo as palavras de João Guimarães Rosa, na obra Grande Sertão: Veredas, “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depoisdesinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”


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