FRAUDES NO FIES
Vagatomia parte 2: Justiça Federal deflagra segunda fase da operação e pressiona o MEC por intervenção
Vagatomia parte 2: Justiça Federal deflagra segunda fase da operação e pressiona o MEC por intervenção
União, Caixa Econômica Federal e FNDE viram réus no processo
União, Caixa Econômica Federal e FNDE viram réus no processo
Gustavo Jesus
A Polícia Federal deflagrou na manhã de quinta-feira, 13, a segunda fase da Operação Vagatomia, denominada “Verità Protetta” (verdade protegida). Policiais cumpriram mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça Federal de Jales na sede da Universidade Brasil na capital paulista e no escritório e residência do atual reitor, o advogado Adib Abdouni.
Após a prisão e o afastamento de José Fernando Pinto Costa antigo reitor e dono da universidade, Adib, que atuava como advogado de defesa da universidade nesta e em outra operação relacionada a fraudes em cursos de medicina, foi nomeado pela esposa do antigo reitor, para ocupar a função do grupo educacional.
De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal de Jales, o novo reitor assumiu as funções e deu início a uma série de ofensas e ameaças à colaboradora das investigações, testemunhas e autoridades públicas responsáveis pela apuração dos crimes cometidos pela organização criminosa investigada na Operação Vagatomia.
O atual reitor foi afastado do cargo e deverá cumprir uma série de medidas cautelares impostas pela Justiça Federal de Jales, como proibição de contato com envolvidos na investigação, alunos, funcionários e pessoas próximas da universidade, nem acessá-la; afastamento das funções na universidade; comparecimento mensal em juízo e proibição de se ausentar da comarca onde reside por mais de 30 dias.
Todo o material apreendido (documentos, celulares, mídias de armazenagem, computadores, dentre outros), foi encaminhado para a sede da PF em Jales para análise. O reitor afastado poderá responder pelos crimes descritos no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013 (obstrução de investigação de organização criminosa) e no artigo 344 do Código Penal (coação no curso do processo), entre outros eventualmente identificados nas investigações em curso.
JUSTIÇA REITERA PEDIDO DE INTERVENÇÃO
Após a deflagração da segunda fase da Operação Vagatomia, a Justiça Federal reiterou decisão de agosto do ano passado para que o Ministério da Educação assuma a administração da instituição de ensino. O MEC não assumiu a administração naquela época alegando falta de capacidade estrutural para tal.
Na nova decisão publicada na quarta-feira, 12, o juiz Bruno Valentim Barbosa, da 1ª Vara Federal de Jales, estabelece critérios para que o ministério assuma o controle da universidade. "Determino ao Ministério da Educação, agora, a nomeação de novos administradores para a Universidade Brasil, no prazo de 5 dias de sua intimação, cuja gestão deverá ser supervisionada diretamente pelo Ministério, tendo em vista que a medida menos intervencionista em desfavor do MEC e da Universidade Brasil, por mim adotada em agosto de 2019, lamentavelmente não foi cumprida".
Na mesma decisão a Justiça Federal estabelece multa de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento da decisão por parte do MEC. "Fixo, desde logo, multa-diária de R$ 50.000,00, limitada a 100 dias-multa em desfavor da União, encontrando-se superada a tese de ausência de possibilidade de multa em desfavor de ente político, sob pena de se admitir a existência de pessoa jurídica que, em última instância, não se submete às decisões judiciais, o que não se coaduna com o que se espera em um Estado de Direito, bem como em desfavor da Universidade Brasil, para o caso de descumprimento da decisão ora exarada".
Apenas no caso da decisão não ser cumprida pelo MEC no prazo estabelecido, a Justiça Federal nomeará um administrador judicial para a instituição.
CAIXA, FNDE E UNIÃO NO BANCO DOS RÉUS
Além das implicações contra a universidade e seu dono, a Justiça Federal inclui a Caixa Econômica Federal, o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
A Caixa se negou a entregar a relação de alunos beneficiados com o FIES, legando que a autarquia não teria obrigação de fornecer os dados pessoais dos estudantes que contrataram o programa.
No despacho, o juiz discorda da decisão da CEF. "Com a devida vênia, não adiro à tese da CEF de que as informações para o FIES não devam ser verificadas por parte estranha aos beneficiados. Ora, a Universidade é beneficiada. Logo, não se pode esperar que somente a sua CPSA verifique a veracidade das informações prestadas pelos alunos, pois há evidente conflito de interesses, o que justifica um controle externo à Universidade e ao aluno, in casu, da CEF, conforme legislação supracitada".
O magistrado também culpa a União pelo descontrole e os possíveis prejuízos com as operações fraudulentas. "O fato é muito simples e claro. Conforme já indicado em minhas decisões anteriores no presente processo, a acusação do MPF e da PF é de prejuízo na ordem de 250 milhões a 500 milhões de reais aos cofres públicos da União. Isso não ocorre 'da noite para o dia', mas um elemento é quase sempre chave em qualquer hipotético desvio de recursos públicos: a falta de controle do Estado".
Em relação ao FNDE, o juiz aponta que a falta de transparência dos órgãos da união favorece esquemas de corrupção. "Aqui, ela é evidente. O FNDE não quer divulgar com maior completude os dados do FIES e alega que o que está público é suficiente. E a CEF não quer fiscalizar as concessões. Ora, é um quadro perfeito para irregularidades, pois se deixa somente ao alvedrio de quem vai se beneficiar dos recursos públicos (aluno e Universidade) o controle do destino das verbas, e ainda não se dá publicidade. Não há dúvidas que se a publicidade existente fosse suficiente, como diz o FNDE, não chegaríamos a esse estado de coisas, com a prisão cautelar de quase 30 pessoas".
FACULDADE SE DEFENDE
A Universidade Brasil publicou uma nota sobre a operação deflagrada pela Polícia Federal, atribuindo ao delegado a "confusão" criada.
Confira o texto na íntegra:
A Universidade Brasil, nesta data, foi vítima de retaliação de um delegado da Polícia Federal — ex-professor da escola, afastado — e do Ministério Público Federal da cidade de Jales (SP). O primeiro foi alvo de representação judicial do reitor Adib Abdouni.
O delegado, consorciado com a ex-funcionária da Universidade — que o havia contratado e se tornou delatora premiada — com o apoio do MP, conseguiu de um juiz, também de Jales, inverter os papéis, de acusado para acusador.
Em nenhum momento o reitor da Universidade Brasil, Adib Abdouni, ameaçou testemunhas ou a colaboradora premiada. A investida contra a Universidade deixa-a acéfala e a torna presa fácil para ofertas de compra por parte de grandes grupos de ensino com ações negociadas em Bolsa de Valores, a preço vil.
No legítimo direito de defesa e sem cometer ilegalidades, o reitor Adib Abdouni havia entrado com representação contra o delegado da Polícia Federal Cristiano Pádua da Silva — contra este foi pedida inclusive sua prisão —, uma vez que vinha intimidando funcionários do campus Fernandópolis da Universidade e o próprio reitor.
A verdade é que desde que Adib Abdouni assumiu a reitoria, em 25 de outubro de 2019, adotou uma série de medidas para colaborar com as autoridades na identificação de possíveis irregularidades que tivessem sido cometidas anteriormente e punir os envolvidos. Criou, inclusive, a Diretoria de Compliance, chefiada por uma delegada da Polícia Federal aposentada.
A Universidade confia que a Justiça será feita e que rapidamente o reitor Adib Abdouni voltará às suas funções, para desgosto de seus detratores e dos concorrentes dessa instituição de ensino.
Assessoria de Imprensa da Universidade Brasil
São Paulo, 13 de fevereiro de 2020
INTERVENÇÃO DO MEC
Até a conclusão dessa reportagem o Ministério da Educação ainda não havia se pronunciado sobre a intervenção na universidade.