Os manuais de redação geralmente orientam para que se coloque o título depois de concluído o texto. Eu faço diferente. Logo que defino o tema a ser abordado, penso no título, que raramente é mudado após a conclusão.
Foi assim que lembrei de um refrão da música “Hoje”, da banda Camisa de Vênus, sucesso nos anos noventa, e peguei emprestado o verso que intitula este texto.
A letra da canção, de modo geral, na minha modesta interpretação, é uma crítica à vida moderna, cheia de tarefas intermináveis, e à confusão de ideias que todo o sistema causa nas mentes dos seres humanos, à mercê dos padrões capitalistas de estética, moda e da própria forma de viver.
Em meio a isso, a música faz menção à correria do dia a dia, motivada pelos inúmeros afazeres das pessoas na tentativa de enquadrarem-se naqueles padrões. Os pais com mais de um emprego, já que, para tonar possível tudo aquilo que é determinado, uma única fonte de renda não é suficiente. Os filhos matriculados em escolas que oferecem mais tempo de estudo, além dos cursos de informática, judô, futebol, balé, piano, inglês, raciocínio lógico, arco e flecha, e mais todo tipo de atividade que o desejo dos provedores achar importante.
Em meio a tantos compromissos, parece que um dia de vinte e quatro horas não é suficiente. A sensação é a de sempre estar atrasado e da necessidade de acelerar para não perder tempo e a hora marcada dos afazeres.
Provavelmente, talvez, quem sabe, seja um dos motivos pelo atraso dos participantes em eventos coletivos, como reuniões, missa, culto, apresentações culturais e tantos outros. Felizmente, isso ocorre com a minoria dos participantes, no entanto, frequentemente, é a justificativa para o atraso do próprio evento.
Ora, se o evento está marcado para ocorrer em um determinado horário, conclui-se que o horário divulgado é aquele que indica seu início, assim, os participantes devem chegar minutos antes, pois a hora estabelecida não se trata do horário de chegada, mas do momento de começar do evento.
O que acontece, contudo, na maioria dos casos, é que o responsável pelo evento costuma atrasar seu início aguardando a chegada dos participantes atrasados, em desrespeito àqueles que já estão no local e chegaram no horário estabelecido. Por outro lado, as pessoas que se atrasam têm como desculpa pronta e sedimentada o fato de que o evento nunca começa na hora marcada.
Ao que parece, um espera o outro e vice-versa, sendo o atraso, o problema central, uma desculpa ou justificativa cuja responsabilidade sempre é delegada à parte adversa.
Eu poderia enumerar aqui os atrasos que habitualmente ocorrem nos eventos coletivos, classificando-os por tipo e frequência, que nesse último quesito, começaria pelos religiosos, onde os atrasos são poucos ou quase inexistentes, avançando para os culturais e de entretenimento e finalizando com os sociais e da esfera política. Só não o farei porque preciso finalizar o texto. Não vai dar para escrever mais, tenho muita coisa a fazer e hoje eu tô atrasado.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com
PS – Em tempos de quarenta e isolamento social, quando os eventos estão sendo realizado online por meio das plataformas digitais, não há atrasos. Quem sabe isso se torne um aprendizado entre tantos outros que poderão permanecer. Com ênfase no poderão.
PPS – Esse texto é uma republicação. Se até a Globo está reprisando quase tudo, quem sou eu para querer ser sempre inédito.