Um amigo meu olhava contemplativo e absorto para a imagem de um quadro na parede como se fosse possível ser transportado para dentro daquela paisagem.
Ela mostrava o recorte de uma praia ladeada por um mar de águas verdes transparentes de um lado e, de outro, uma casinha simples, com telhado de palha, rodeada por densa vegetação.
Em um dado momento, ele inspirou fundo e, em seguida, soltou o ar dos pulmões pela boca fazendo barulho. Um quase-sopro, como fosse possível cuspir seu desalento por estar do lado de fora daquela imagem.
Imaginei tal sensação depois de suas palavras, quando conseguiu desgrudar o olhar do quadro e pular para fora daquela paisagem paradisíaca, divagando também em achismo sobre qual seria o melhor lugar do mundo para viver.
Sem querer ser desmancha prazer e sendo-o ao mesmo tempo, respondi que quem fosse que morasse naquela casinha talvez já estive de cansado daquele mar verde transluzente, assim como de toda calmaria do lugar e, quem sabe, nunca tivesse notado ou fizesse ideia de que pudesse estar morando em um tipo de paraíso.
Assim é a cidade da gente, um paraíso para quem está do lado de fora do quadro e, quase sempre, um lugar chato para quem está vivendo dentro dele. Isso acontece por dois motivos: ou não nos apercebemos daquilo que tem de bom em nossa localidade, cegados pela rotina do “caminho da roça” que percorremos diariamente, sem mudar quase nunca o trajeto nas andanças casa-trabalho-mercado-mesmolugardediversão, ou porque, realmente não gostamos da cidade onde moramos. Nesse segundo caso, não se trata da cidade da gente.
A cidade da gente é nossa cidade natal ou a cidade que escolhemos para morar ou ainda aquela pela qual nos apaixonamos. Pode ser a cidade natal onde moramos ou aquela que nos deixa ansiosos para um reencontro quando moramos em outro lugar.
Tem gente para a qual a cidade natal é seu eterno lar, por escolha própria ou decisão do destino. Isso pode fazer a diferença entre o paraíso e o chato-lugar ou lugar-qualquer.
Muitas pessoas já moraram em tantas cidades que já são cidadãos do mundo. O que não exclui a possibilidade de terem a cidade deles, no coração, na saudade ou na lembrança.
Outras tantas sequer colocaram os pés fora do seu município desde que nasceram. Acreditem, isso acontece em grande quantidade, de maneira assustadora para os cidadãos do mundo e na maior normalidade para aqueles que vivem no seu paraíso particular ou em seu fadado cercado imaginário.
A cidade da gente é aquela que tem nossa casa. Aquela para onde sempre queremos retornar depois de algum tempo fora. Aquele lugar que nos traz segurança ou, ao menos, a sensação dessa.
É o lugar para onde queremos voltar algum dia. É como a sombra larga de uma árvore sob a qual queremos deitar. É nossa tabebuia florida da cor que eu quiser imaginar.
A cidade da gente é aquela que todo mundo que mora nela pode até falar mal, só não pode fazer o mesmo o morador de qualquer outra, principalmente se for de localidade vizinha. É como família, só pode criticar que faz parte dela.
Minha “cidade da gente” foi onde nasci e adolesci. Foi onde chorei e sorri. Onde trabalhei e cresci. Minha cidade é aqui. Onde escolhido, escolhi, foi decidido ou decidi.
Por isso quando faz aniversário eu também comemoro, agradeço e oro. Junto as mãos porque com ela me desenvolvi e rogo para que se torne árvore frondosa, para que sua sombra possa dar o refrigério que a alma de seus filhos necessita, que seu tronco seja o esteio de muitas vidas e suas flores possam brotar em sinal de vitória.
Seja em 1º de janeiro ou 22 de maio, quero sempre cumprimentar a terra de Fernando, de Sérgio, Camila e Cecília, de João, José e Maria ou de Mário.
Parabéns Fernandópolis.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com