Mais cala uma imagem do que mil palavras. Essa deveria ser a máxima, posto que a cena reproduzida por qualquer meio visual não pode explicar-se verbalmente. Sozinha não é capaz de produzir palavras. Ao contrário do propalado no dito popular original, a imagem não é autoexplicativa, muito mais “autoimaginativa”, se assim permitisse o neologismo.
Outra premissa, que se liga com a anterior, revela-se no fato de o ser humano ter a necessidade de aparecer-se, ficar em evidencia na cena que melhor lhe aprouver. Tal fato é mostrado na história da humanidade por diversas maneiras, na forma de ostentação das pirâmides e dos luxuosos palácios de reis e imperadores, dos inúmeros tipos de adornos em materiais preciosos usados em diferentes culturas por aqueles que detinham o poder financeiro ou a quem fosse concedida autoridade, quando não, ambos ao mesmo tempo.
O mostrar-se também tem ocorrido desde o surgimento dos desfiles cívicos e militares, a princípio, com o objetivo de comemorarem-se feitos e vitórias de um império, estado ou uma nação, também para demonstrar poder.
Mesmo que a finalidade fosse um “aparecer” coletivo, não deixavam de proporcionar a exibição, em segundo plano, dos representantes maiores das nações, estados ou impérios, posicionados em lugares de destaque no acontecimento, como se faz até hoje.
Assim como os demais participantes que, de forma obrigatória ou voluntária, também se dispunham a participar do evento para, em qualquer momento, fazerem-se notados pela audiência.
Da mesma forma é o gosto das crianças, e depois dos adultos, ao quererem ser modelos para desfilarem na passarela, ou artistas, “para aparecer na televisão“, cuja frase tem sido repetida desde o surgimento daquele aparelho. Mesmo antes, na era do rádio, ouvir o próprio nome em um programa, divulgado publicamente a todos os ouvintes, era fazer-se notado, lembrado em pensamento.
Hoje, são as redes sociais, com suas selfies e registros fotográficos de todas as cenas da vida cotidiana. Do despertar ao dormir, da refeição sobre mesa ao prato no restaurante, dos unânimes rostos bonitos dos perfis aos registros das vidas felizes de seus proprietários.
Nada de novo, como já disse em outro texto, as redes sociais não construíram novo seres, apenas colocaram uma lupa gigantesca na velha sociedade humana (e também na desumana).
Certo ou errado, nunca saberemos. Tampouco trata-se do tema aqui em questão. Não sou juiz do mundo, nem nunca pretendi sê-lo. Sou mero e ínfimo expectador e, secundariamente, ator, ou vice-versa. Todavia, por vezes, expectador ativo, como aquele que não somente vê, mas percebe, modéstia à parte (ou às favas, por falar em aparecer).
Assim, nada a criticar o “aparecer-se” de quem quer que seja, já que configura ato inerente ao ser humano. Apenas, concluir que as imagens produzidas de si mesmo têm mais a ver com o aparecer do que o ser.
As imagens quase nunca revelam a realidade. São produzidas, de forma consciente ou inconsciente, tão somente para “mostrar” aquilo que poderia ser ou desejava que fosse. Não é prioritário o simples “aparecer”, essencialmente o “parecer”.
“Aparências, nada mais”, já cantou Marcio Greyck, um dos ídolos da Jovem Guarda, na década de setenta. As aparências vivas ou perpetuadas em imagens são ficção, a vida é real, ainda que se decida viver na ficção.
A conclusão sobre o que é real jamais poderá ser feita, tão somente, observando-se qualquer cena ou analisando-se determinada imagem. Tudo que disso partir será meramente suposição, “De que os olhos mortais, radiantes de ventura,/Nada mais são que espelhos turvos e cativos!”, como poetizou Baudelair.
Aparentar é mostrar na aparência, revelar exteriormente. Sinônimo de fingir, simular. A imagem é parente, às vezes próximo, às vezes distante. O verdadeiro não é fictício, enganoso, simulado.
O vivido é o real, que se opõe ao imaginário, aquilo que pertence ao domínio da imaginação, por isso, apenas imagem, que se pede para imaginar, fazer ideia, fantasiar, receber a mensagem desejada pelo emissor.
A imagem é muito pouco. O muito é aquilo que não se vê, mas se sente, se vive e revive. Feio ou bonito, prazeroso ou dolorido, ainda é melhor viver, o factual e o fatal, por mais esperança e deleite que nos dê a imaginação.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com