Quando eu era adolescente, era insatisfeito com algumas respostas que obtinha, acredito a maioria o seja. Devido a isso, sempre fui muito curioso. Na busca por sanar minha inquietação, lia de tudo – de almanaque de autoajuda a livro de bruxaria. Bruxaria branca segundo seus autores. Toda semana, gastava quase todo meu dinheiro na banca de jornais, comprando Wicca.
Uma de suas edições veio falando sobre um ritual – O ritual das folhas secas. Consistia em sair pelas ruas, bosques, parques, enfim, qualquer lugar onde se pudesse recolher folhas secas, caídas ao chão. Cada uma dessas folhas representava uma situação da vida da gente e que depois juntá-las, a gente deveria queimar como um ato de desapego àquilo que estava mal resolvido em nossa vida. Um acerto de contas com o passado. Hoje, eu consigo enxergar que aquilo é pura psicologia. A autora do livro alertava para um possível pranto durante ou após o ritual. O que também pode acontecer durante uma sessão de terapia.
Assim como na literatura, alguns prazeres despertam catarse; e tudo o que fazemos para nos melhorar, como uma renovação, desperta emoções. Hoje, adulto, não menos curioso, apenas mais focado e com mais discernimento, entendo aquela metáfora. Morando na mesma cidade desde que nasci, cada pedaço dela conta uma história, e como perfaço alguns caminhos várias vezes na semana, eles têm mais de uma história para contar. Ou seja, meu repertório emocional sobrecarrega. Percebo que meu humor muda, fico diferente. São as folhas secas que vou recolhendo pelo caminho, sem as ter queimado, quase sempre as carrego comigo. Rememorando alguns acontecimentos, revendo pessoas e lugares, revivendo diálogos e projetos. Alguns aconteceram outros foram apenas sonhos...
Eu, que sou muito analítico, gosto de saber de onde vem cada sensação, estou sempre antenado aos acontecimentos ao redor. Se estou feliz, eufórico, gosto de saber por que, ainda que não precisemos buscar uma razão para a alegria. Se há algo me incomodando, se fico triste ou quieto de repente, logo busco saber de onde vem aquela sensação ou pensamento. Não gosto de desarmonizar, de entrar em “desequilíbrio”, embora precisemos desses momentos para nos reequilibrar. Começo a fazer o processo reverso; caso necessário, até encontrar o motivo.
Cada um de nós tem a sua ferida aberta e ao menor toque ela pode inflamar. É dolorido ter sempre que carregar nossas folhas secas, de sobrecarregar lembranças, traumas e acontecimentos mal resolvidos. Como dizia tia Clô, personagem de uma novela – “As idades são como as estações, e cada uma tem a sua beleza.” – Acredito que em nossa vida, como no ritual, embora nunca o tenha realizado, é preciso queimar as folhas para que a natureza se renove e para que nossa bagagem fique mais leve.
Rodrigo Daum
Formado em Letras pela Fundação Educacional de Fernandópolis
Pós graduado em Docência para o Ensino Médio, Técnico e Superior