A correria, a agitação e a pressa da vida cotidiana moderna tem sido assunto de muitos de meus textos. Fiquei pensando sobre o motivo disso, se eu que sou assim, agitado, apressado, ansioso ou se a maioria das pessoas está mesmo agindo de tal forma.
A conclusão parece óbvia: as duas alternativas estão corretas. Mas é sempre bom refletir para saber se aquilo que é colocado nas linhas do texto diz respeito somente a quem escreve, quando o interesse pelo assunto será restrito, ou se os temas abordados abrangem outras pessoas, sendo de interesse geral.
Concluir sobre um autoquestionamento demanda reflexão e observação. Para saber de si, às vezes, a reflexão basta. Se lançar mão da observação, ela deverá ser de seus próprios e exclusivos atos, pensamentos e palavras. Para analisar comportamentos alheios e coletivos a ferramenta mais indicada é a observação dos atos e palavras das pessoas e do funcionamento das coisas e dos costumes.
Foram esses os métodos utilizados na busca das conclusões mencionadas, ou seja, que sou apressado, ansioso e todos os “ados” e “osos” decorrentes desses, assim como também é a maioria dos seres humanos e inumados (e não me refiro aos personagens de Stan Lee) que vivem em (só)ciedade.
Há muitos símbolos modernos de nossa pressa, mas um deles parece sintetizar com bastante particularidade nossa correria externa e interna e a total falta de paciência, contrariando até mesmo a bíblia, já que a maioria dos brasileiros se declara adepta do cristianismo, quando ela diz em Hebreus que “esperando com paciência, alcançou a promessa”.
Também no livro dos Salmos “Esperei com paciência no SENHOR”, e não estou falando da ausência das cadeiras nas calçadas das casas, onde havia o bate-papo desinteressado, a troca das experiências e dos dissabores da vida, talvez diferentes dos de hoje, mas com certeza com menos intensidade e menos prejuízos emocionais, já que todos tem medo de roubo ou furto (das próprias cadeiras), estou falando de outro símbolo.
Foi observando-o todos dos dias, no ritual do mesmo caminho de casa para o trabalho e do trabalho para casa, realizado rotineiramente, seguindo a trajeto que estipulamos a nós mesmos nos caminhos que decidimos trilhar, sejam eles físicos, mentais, emocionais, reais ou virtuais, que percebi nossa completa falta de paciência, desencadeada por nossa apressada pressa, sem querer ser pleonástico, apenas enfático.
O verdadeiro totem da impaciência moderno é o semáforo, ou pelo menos o que fizeram e fazem dele. Notem que ele surgiu modesto, tão somente para disciplinar o trânsito, pedir para que um espere enquanto outo possa passar.
Primeiramente, seus sinais luminosos eram apenas o vermelho e o verde, dizendo pare e siga. Mas isso ocorria antes mesmo dos carros serem inventados, quando as pessoas utilizavam cavalos, vagões e outros meios de locomoção.
Como duas cores não foram suficientes para evitar acidentes, implantaram uma terceira para dizer “atenção! Agora vai ficar vermelho e você precisa parar”. Atenção que nada, continuaram a avançar o amarelo, não dá para esperar três ou quatro segundos, é muito tempo para quem tem pressa.
Os condutores de motos há muito não olham mais para seu próprio semáforo, olham para o outro na transversal, quando aquele indica vermelho, já arrancam, porque aqueles segundos entre o vermelho do outro e o verde do seu sinal é muito tempo para quem tem pressa.
Mais recentemente, criaram um novo modelo de semáforo, com uma inovação dirigida (não sei se esse é o termo mais apropriado para o texto) aos ansiosos motoristas. Incluíram na sinalização semafórica um cronômetro regressivo que mostra o tempo em que o sinal se manterá no vermelho. Acho que não foi suficiente para controlar a impaciência dos transeuntes, porque criaram outro cronômetro regressivo para indicar por quantos segundos o sinal verde estaria aberto.
Parece que tais informações não estão sendo úteis ou suficientes para aplacar a inquietação e agonia dos motoristas, diante dos sinais luminosos do semáforo, até porque os motociclistas continuam a olhar o semáforo transversal, com já estão fazendo agora os condutores de outros veículos.
Quem sabe a próxima invocação seja outro dispositivo instalado junto ao semáforo para que, quando a luz vermelha acenda, um braço mecânico, com uma seringa na extremidade, se estique até o motorista do veículo e lhe dê uma injeção com doses de sertralina, citalopram ou qualquer outro medicamento com nome terminado em “olam” e “epam”.
Eu sei, estou assistindo filmes de ficção em excesso. Então quem sabe façam uma alteração no texto da bíblia mudando para “esperando com paciência, alcançou o destino” e “Esperei com paciência no SEMÁFORO”, ou pelo menos coloquem em prática o texto original.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com