Caio sonha em terminar o curso de pedagogia para trabalhar como professor de crianças quem também têm deficiência visual
Por Lívia Caldeira
Caio Gustavo Rodrigues, de 22 anos, é deficiente visual desde o nascimento, o que não o impediu de derrubar barreiras que tentaram ofuscar o seu destino. Para termos noção do quanto a vida dos cegos é difícil, basta pensarmos sobre as coisas que fazemos em nosso dia a dia: uma simples caminhada pela calçada com lixeiras, garagens, árvores e postes, se torna uma atividade praticamente impossível se devemos fazê-la de olhos fechados. Mas para o jovem, que cursa o 7º semestre de pedagogia, toda dificuldade pode ser superada, basta acreditar e jamais desistir. Completamente independente e autônomo, Caio é um exemplo de superação e vontade de vencer. Ele encara a própria deficiência como um desafio e não como desculpa para não realizar seus sonhos. Em entrevista ao “O Extra.net”, ele conta um pouco sobre a sua história de vida, considerada inspiradora por amigos, familiares e pessoas que o conhecem.
O EXTRA: Quando foi diagnosticada a sua deficiência visual?
CAIO: Desde que eu nasci fui diagnosticado com o que eles chamaram de “atrofia no nervo ótico”. O mais chocante da minha história é que provavelmente sou cego devido a um erro médico durante o parto. O médico deu para minha mãe duas doses de uma anestesia, em um intervalo de tempo inferior ao permitido, o que seria a possível causa. Quando estava com 3 meses de idade, minha avó começou a desconfiar que havia algo de estranho comigo. Foi então que fui encaminhado para um hospital em Campinas e, após a realização de diversos exames, misteriosamente sumiram com os papéis. Até hoje ainda não sei o que causou a minha cegueira, é uma incógnita. Não posso afirmar que foi erro médico, pois não tenho provas, ou melhor, sumiram com as provas, mas não tenho nenhuma dúvida de que foi erro médico.
O EXTRA: Como foi a reação da sua família e os seus primeiros anos de vida?
CAIO: A princípio, minha família disse que ficou muito chocada. Até os 5 anos de vida, foi tudo muito difícil. Eu precisava ir sempre à Campinas para acompanhamento e minha família não tinha condições financeiras. Vivíamos pedindo dinheiro emprestado e eu não me alimentava direito, o que provocava outros problemas de saúde. Comecei a ter convulsões frequentes e não me desenvolvia como as outras crianças. Apesar de muito pequeno, consigo me lembrar dessa fase da minha vida. Felizmente, depois dos 5 anos, tudo se normalizou e passei a crescer, brincar e correr como qualquer outra criança.
O EXTRA: Como é a sua vida hoje?
CAIO: Hoje eu sou completamente independente, mas tive que lutar muito para conquistar essa autonomia. Força de vontade é tudo! Muitas vezes, me locomovia sozinho escondido da minha família, para mostrar à todos que eu era capaz de fazer o que eu quisesse. E foi assim, por necessidade, por vontade de vencer, que eu me tornei um dos deficientes visuais mais independentes da cidade. Sou universitário, estudo, vou à biblioteca, e até já liderei um grupo de jovens na minha igreja.
O EXTRA: Você tem esperança de um dia poder enxergar?
CAIO: Embora o meu quadro tenha melhorado com o passar do tempo (antes ele era completamente cego e agora percebe reflexos de luz), eu não nutro a esperança de um dia enxergar. Aliás, eu não quero enxergar. Se eu não fosse cego, eu não seria a pessoa que me tornei hoje. Foi graças a minha deficiência que eu conheci pessoas maravilhosas e é ela que me dá forças para lutar pelo meu sonho de ser professor para crianças que também são cegas. É por isso que estou fazendo pedagogia, quero me formar e trabalhar com ações para pessoas com deficiência.
O EXTRA: Você acha que existe preconceito com pessoas deficientes?
CAIO: Eu nunca sofri preconceito. A sociedade está sim se preparando para os deficientes, mas faltam recursos. Para estudar, por exemplo, nem sempre consigo achar todos os livros que preciso em braile, e o jeito é eu me virar. Nas calçadas existem muitos obstáculos: árvores, orelhões, lixeiras, garagens... Já fui atropelado uma vez porque sou obrigado a andar na rua. Eu acredito que a inclusão para qualquer tipo de deficiência já teve um grande avanço, mais ainda tem muito a melhorar.
O EXTRA: O que você aprendeu com a sua deficiência?
CAIO: Eu, muitas vezes, brinco com a minha deficiência. Além de ser cego, tenho também vários problemas familiares, mas eu uso a crise a meu favor. Não quero ser visto como vítima, sou perfeitamente capaz de tudo. Acredito muito em Deus e confio nele, é por isso que sempre aceitei seus planos para mim. Não reclamo, não me lamento. Ao invés disso, eu tenho fé e vivo muito bem.