SOLIDARIEDADE
Brasil é referência em transplantes, mas fila de espera ainda é um desafio
Brasil é referência em transplantes, mas fila de espera ainda é um desafio
Recusa familiar permanece como um dos principais entraves para ampliar o número de doações
Recusa familiar permanece como um dos principais entraves para ampliar o número de doações
Foto: Reprodução / Fonte: Camila Hampf/Hospital Pequeno Príncipe
Da Redação
De acordo com o Ministério da Saúde, mais de 40 mil pessoas aguardam por um transplante no Brasil e cerca de três mil morrem todos os anos enquanto esperam por um órgão. Apesar de o país ser referência mundial em transplantes, a fila ainda é um desafio. Segundo dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), em 2025 a recusa familiar à doação é de 45%, ao passo que a lista de espera continua maior que a oferta de órgãos doados.
Por isso, no Dia Nacional de Doação de Órgãos, lembrado em 27 de setembro, o Pequeno Príncipe, que é o maior e mais completo hospital pediátrico do país, reforça a importância da conscientização para esse gesto capaz de salvar a vida de milhares de crianças, adolescentes e adultos. “Os tratamentos paliativos conseguem, em muitos casos, prolongar a vida de quem aguarda um órgão compatível. Mas o transplante vai além, pois devolve a possibilidade de desfrutar a vida, de estar com a família e de sonhar com o futuro”, enfatiza José Sampaio Neto, médico responsável pelo Serviço de Transplante Hepático do Pequeno Príncipe.
Como ser um doador?
Um doador pode salvar até oito vidas, segundo o Ministério da Saúde. No entanto, um dos principais motivos de impedimento é a recusa de familiares. Por isso, é fundamental que a família esteja ciente dessa decisão para que o processo ocorra com agilidade. Além disso, desde 2024 é possível registrar digitalmente essa intenção.
A manifestação digital tem validade legal — e, com a mudança recente na legislação brasileira, a vontade expressa em vida deve ser respeitada. “Antes, mesmo com autorização em vida, a custódia ficava com a família, que podia decidir não fazer a doação. Essa mudança garante ainda mais segurança jurídica e permite que a vontade do doador seja respeitada”, explica José Sampaio.
O especialista reforça ainda que a identificação da morte encefálica é absolutamente segura no Brasil. “A certificação é extremamente cuidadosa, exigindo exames clínicos, de imagem e de confirmação de atividade cerebral. Uma vez atestada a morte encefálica, o processo é irreversível. A doação de órgãos ocorre apenas entre a descontinuidade dos suportes e a confirmação da morte, garantindo total segurança e transparência para todos os envolvidos”, afirma.
A doação de órgãos também pode acontecer em vida. Nesse caso, é possível doar um dos rins, parte do fígado, da medula óssea ou do pulmão, desde que haja compatibilidade e não exista risco significativo para a saúde do doador. “Casos mais ou menos urgentes são avaliados em relação à possibilidade de esperar ou não por um órgão. Em situações críticas, como a hepatite fulminante, em que o paciente pode morrer em poucas horas ou dias, não há tempo para aguardar um doador falecido, então o transplante intervivos se torna praticamente mandatório”, ressalta o médico responsável pelo Serviço de Transplante Hepático do Hospital Pequeno Príncipe.
Vida transformada
Um exemplo de vida transformada com a doação de órgãos é a de Bento Coutinho, de 3 anos, diagnosticado com hepatoblastoma aos 8 meses. “Na época, ele fez o tratamento de primeira linha, ficou bem, e o câncer entrou em remissão. Em outubro de 2024, nos exames de rotina, foi detectado a recidiva”, conta a mãe, Geovana Coutinho.
Com a volta da doença, o transplante se tornou a única opção. “Desde a notícia da necessidade do transplante, já sabíamos que eu e meu esposo poderíamos ser doadores. Então, ficamos bem confiantes, dispostos a fazer o que fosse preciso e na torcida para que pudéssemos dar a chance de cura de novo para ele”, diz Geovana.
O pai, Gustavo, foi considerado compatível e doou parte do fígado ao filho em uma cirurgia que marcou o 100.º transplante hepático do Hospital Pequeno Príncipe. “Foi angustiante ver meu marido e meu filho em cirurgia ao mesmo tempo, mas a equipe nos deu segurança. Hoje, só temos gratidão por essa chance de cura”, finaliza a mãe de Bento.
Referência
Há 36 anos, o Pequeno Príncipe realiza transplante de órgãos (coração, fígado e rim) e tecidos pediátricos. Em 2024, foram realizados 293 procedimentos. Ao todo, 38 de órgãos sólidos (coração, rim e fígado), 41 de válvula cardíaca, 153 de tecido ósseo e 61 de medula óssea. Neste ano, até agosto, o Pequeno Príncipe já realizou 191 transplantes, consolidando a organização como um dos centros de referência para esse tipo de procedimento no país.