Livia Caldeira
São muitas as histórias de vida que podem ser ouvidas em apenas uma tarde transcorrida na companhia dos cerca de 50 idosos do Asilo Parque Residencial São Vicente de Paula, em Fernandópolis. Cada rosto revela diferentes trajetórias de quem já passou dezenas de natais, páscoas, aniversários e outras datas. A Reportagem conversou com alguns deles que fizeram questão de contar como esperam passar este final de ano e o que desejam para 2019. Eles aproveitaram a oportunidade também para compartilhar algumas reflexões.
"Sou extremamente grata a tudo que vivi ao longo dos meus 91 anos de idade. São inúmeras memórias, algumas boas e outras ruins. Já fui casada e já passei muitos natais ao lado do meu marido, irmãos, pais e parentes. Este natal provavelmente passarei aqui e será tão feliz quanto os outros. Tenho a companhia dos meus amigos e de todo o pessoal que trabalha no asilo por quem eu tenho um carinho infinito. A vida foi boa comigo e não posso reclamar. Para o ano que vem espero que as pessoas tenham mais amor e menos desavenças. Aprendi que o maior bem que levamos com a gente é o amor das pessoas que cultivamos. Ninguém nunca vai se arrepender de ter dado amor aos outros".
(Teresa - nome fictício, 91 anos)
"Ainda tenho muitos sonhos que gostaria de realizar, como terminar de estudar, por exemplo. Hoje eu sinto como se o tempo tivesse parado para mim. A vida nos reserva muitas surpresas, dias felizes e dias tristes. Nós temos que aprender a aproveitar mais os felizes e superar os tristes. Este natal vai ser pra mim uma data como todas as outras, mas desejo que esse novo ano seja melhor para todos nós".
(Antônio - nome fictício, 66 anos)
"Já passei muitos carnavais. Estou há 4 anos aqui no asilo. Acho que os anos 70 foram os mais felizes da minha vida. Eu estava bem em todos os sentidos. Nesse final de ano eu quero poder estar ao lado da minha família, isso me deixa muito feliz. Para o ano que vem eu desejo a todos paz e amor, é o que o mundo está precisando. E se eu pudesse dar um conselho a quem tem menos idade que eu e uma vida pela frente ainda seria esse: viver bem e não perder tempo com coisas pequenas".
(Carlos - nome fictício, 76 anos)
INVISIBILIDADE
Abandono, rejeição, escolha própria, solidão... São diversas as razões que os trouxeram até o asilo. Como explica Everson Mandarini Masson, psicólogo da entidade, trabalhar na instituição é um desafio diário. "É muito comum casos de depressão aqui dentro. Muitos se sentem solitários, angustiados, e estão aqui porque não querem ser um peso na vida dos familiares", conta. Segundo ele, a maior missão de todos os colaboradores é chamar atenção da sociedade para a causa. "São seres humanos que não querem e não podem se tornar invisíveis, eles se sentem, muitas vezes, descartáveis, esquecidos no tempo. Seria muito importante que todos abraçassem essa missão conosco", finaliza.
OPERANDO ALEGRIA
Duas vezes ao mês os idosos recebem um atendimento "médico" especial. Com roupas coloridas, muito bom humor, piadas e sorriso no rosto, os Doutores Palhaços chegam à entidade levando alegria.
O grupo, que faz parte do projeto Dr. Faz de Conta, se encarrega dessa importante missão há mais de dois anos. É um dos poucos projetos que trabalha com adolescentes, favorecendo o contraste de universos diferentes e gerações tão distantes.
Aos 14 anos, Brenda Aparecida Gonçalves, a Dra. Malagueta, é uma das voluntárias. "Comecei bem nova, é uma experiência incrível. Eu recebo em troca amor, muito amor, que faz de mim uma pessoa melhor. Não tem dinheiro que pagaria a gratidão que ganhamos vindo aqui no asilo. A cada visita que faço, acumulo um pouquinho de felicidade a mais, que vai se somando na minha vida e a recompensa é a minha própria felicidade", conta.
Luis Rao, idealizador da iniciativa, enfatiza que compartilhar risos é o principal objetivo."O projeto vem crescendo, estamos com vários voluntários e pretendemos ampliar os atendimentos, além de fazer com que a comunidade seja mais participativa e colaborativa conosco".
A ex-paciente dos Drs. Palhaços, Maria Helena Gandolfi, também quis compartilhar suas experiências com a reportagem. "Eu já recebi o tratamento desses médicos e foi fundamental para mim. Eles contribuíram para que eu amasse ainda mais a vida", afirma Maria, que hoje colabora diretamente com o projeto oferecendo caronas ao grupo.
GESTOS QUE FAZEM A DIFERENÇA
Aproveitando espírito natalino, Moacir Pontes, que costuma ajudar frequentemente a entidade, resolveu trazer uma rosa a cada um dos idosos. "Na medida do possível, procuro sempre dar uma mão, é gratificante ver eles tão felizes com um gesto tão pequeno da minha parte", comenta. Acompanhado da netinha Mariah, de apenas 8 anos, ele distribuiu as flores pelo asilo, arrancando sorrisos por onde passava. "Quero que minha neta desde novinha tenha contato com essa realidade, com certeza ela só tem a ganhar".