SANTA CASA

“Abandonada na trincheira”: confirmado prejuízo de R$ 2 milhões com pandemia

“Abandonada na trincheira”: confirmado prejuízo de R$ 2 milhões com pandemia

Uma guerra invisível: “Além da complicada situação com superlotação de leitos, profissionais adoeceram”

Uma guerra invisível: “Além da complicada situação com superlotação de leitos, profissionais adoeceram”

Publicada há 2 anos

João Leonel

Conforme adiantado em matéria cujo título é “Santa Casa tem déficit de quase R$ 2 milhões durante a pandemia”, publicada dia 4 de novembro neste “O Extra.net”, na edição de nº 4132 do jornal (confira aqui), relatório final de análise de receitas e despesas, contabilizando gastos gerais do hospital, registra uma “dura marca”, como apontado pelo administrador judicial Marcus Vinicius Paço Chaer.

Em petição ao juiz Vinícius Castrequini Bufulin, que conduz a intervenção judicial da Santa Casa de Fernandópolis, Marcus Chaer confirma déficit superior a R$ 2 milhões.

“A Santa Casa, que apesar de sua herança maldita e anos de espancamento financeiro que sofreu, recuperou-se no primeiro triênio de 2020, reduzindo seu déficit contábil de maneira bem decente. Infelizmente, a pandemia aconteceu e, mesmo assim, a Santa Casa conseguiu manter-se de pé, melhorando serviços SUS e particulares, aumentando seus indicadores, transformando-se em um lugar digno, de bom atendimento e com estrutura inclusive climatizada para atendimento da população em geral, apesar de toda a falta de apoio e ataques contra o hospital. A Pandemia, porém, deixou uma dura marca: déficit aproximado de R$ 2.036.421,97(dois milhões, trinta e seis mil, quatrocentos e vinte e um reais e noventa e sete centavos), apurado até o momento desta petição”.

Segue a petição:

“O déficit é totalmente justificável ao analisarmos não só o impressionante aumento de preços que os medicamentos sofreram, mas também sua oscilação e escassez. Para se ter uma ideia, o hospital dispensava (‘consumia’) em torno de R$ 490.000,00 (quatrocentos e noventa mil reais) por mês em materiais médicos e medicamentos, no período pré-pandemia, conseguindo disponibilizar estoque de segurança para várias semanas ou alguns meses, dependendo do medicamento. Durante a pandemia, chegamos a encarar valores como R$ 1.574.371,83 (um milhão, quinhentos e setenta e quatro mil, trezentos e setenta e um reais e oitenta e três centavos) em seu ápice para abastecer o hospital em apenas um mês. Medicamentos anestésicos, como ‘Midazolam’ e ‘Rocurônio’, chegaram a representar, aproximadamente, R$ 500.000,00(quinhentos mil reais) somados, dependendo do mês. Ou seja, apenas dois medicamentos ultrapassaram o valor que o hospital despendeu durante um mês, anteriormente”.

Marcus Chaer cita também uma questão que gera muita polêmica, além de prejuízos sistêmicos à Santa Casa: os repasses. Confira:

“O prejuízo fica ainda mais palpável ao observarmos que os valores repassados pelo Governo Federal (passando antes para o Governo Estadual) pelos leitos de UTI COVID são de R$ 1.600,00 (mil e seiscentos reais) por dia. Os valores repassados pelos mesmos entes pela diária de Enfermaria COVID são de R$ 300,00 (trezentos reais). O prejuízo ocorre, porém, ao observarmos que a maioria dos leitos custou mais do que recebeu de custeio. Houve leitos que chegaram a custar aos cofres do hospital valores de dois, três, quatro ou até R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por dia, devido aos fatores já mencionados. Porém e infelizmente, os valores dos repasses nunca foram reajustados, tampouco a manutenção e funcionamento do hospital recebem auxílio, apesar do absurdo custo. Foram gastos ainda valores para aquisição de equipamentos, reformas e mudanças na infraestrutura para atender às necessidades da pandemia. É válido mencionar que corremos o risco de ter de encarar outra fase da pandemia, advinda de uma nova variante do vírus”.

A petição é finalizada dando ciência de todo o exposto tanto ao juiz interventor quanto ao Ministério Público.

ABANDONADOS NA TRINCHEIRA

Confira relato do atual gestor da Santa Casa sobre a situação caótica gerada durante a pandemia, e a falta de respaldo.

“A já notória pandemia de COVID-19 trouxe prejuízos tanto às vidas quanto à condição financeira da população em geral. Os empresários também sofreram com o peso de não poderem abrir suas portas durante meses. É muito difícil mensurar quem saiu mais prejudicado de toda a situação. Porém, baseado em nossa experiência durante a pandemia, podemos afirmar que os hospitais foram duramente impactados, quando deveríamos estar sendo apoiados e recebendo o suporte necessário. É notório que, enquanto todos ficavam dentro de suas casas, os chamados ‘heróis’ (vulgo profissionais de saúde) estavam na linha de frente e retaguarda dentro dos hospitais, postos de saúde, ambulâncias e afins, arriscando suas vidas e deixando de ficar com seus familiares para cuidar dos nossos. Os hospitais, que não fecham suas portas em hipótese alguma (seja em guerras, crises ou catástrofes), funcionaram a todo vapor para poder combater o vírus que ainda nos assola, tendo seus profissionais e estrutura à disposição vinte e quatro horas por dia, com pouco ou mínimo descanso, muitas vezes. Houve situações em que foi necessário operacionalizar leitos em minutos, com as mínimas condições, para não deixarmos as pessoas desamparadas nos corredores ou fornecer o mínimo de assistência a elas. Obviamente, imaginamos à época que nossos governantes fariam todo o possível para que pudéssemos manter essa batalha, nos fornecendo suprimentos, segurança, recursos e meios de vencer o maligno vírus (até por que o hospital não passa de um prestador de serviços, sendo de responsabilidade do Estado o custeio dos valores justos). Pois bem, o total oposto aconteceu. Fomos ‘largados às trincheiras’, onde além da complicada situação que passamos internamente, com superlotação de leitos (também pelo país afora), profissionais adoecendo ou com medo e falta de estrutura, ainda contamos com os ataques externos: aumento de ICMS (inclusive para materiais médicos e medicamentos, porém revogado posteriormente), corte de verbas e repasses de programas, não reajuste de valores, como tabela SUS, falta de medicamentos e outras calamitosas situações que tivemos de passar, enquanto tentávamos salvar o maior número de vidas possível. Em suma, ficou mais caro manter o hospital em funcionamento, enquanto que a tabela SUS, por exemplo, continuou inalterada”.

Reprodução de trecho do relatório da Santa Casa apresentando valores com despesas durante a pandemia

Relatório foi apresentado oficialmente ao juiz Bufulin, dando ciência também ao MP

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