Da Redação
O professor de Filosofia, José Renato Sessino Toledo Barbosa, ou simplesmente Zé Renato, articulista deste "O Extra.net", acaba de se aposentar "no Estado" (ainda é professor na Unijales e busca novas Faculdades para trabalhar). Melhor dizendo, "não estou oficialmente aposentado, pois ainda estou em noventena", ressalta. Lecionou durante 33 anos e 6 meses na rede pública de São Paulo. Ex-professor no JAP e no Cáfaro, escolas tradicionais do município, recorda-se de uma depressão que o afastou de seu ofício por 8 meses, entre os anos de 2010 e 2011, pouco antes de se mudar para Fernandópolis. "Não só pela depressão que tive, mas pela ausência de um fio sequer de esperança por um futuro melhor nesta profissão, não sinto, e nunca sentirei, posso afirmar, falta nenhuma da sala de aula", destaca Zé, que crava: "O quadro é extremamente nebuloso e tenebroso. Estamos no fundo de um poço sem fundo", citando Fernando Pessoa. Mas, além de duras críticas, vindas de quem conhece a fundo o "submundo" das escolas públicas paulistas, Zé também indica o que se pode melhorar na rede estadual de ensino. Confira nesta entrevista especial com Zé Renato, que não terá, como alega, mas, com certeza, deixará muitas saudades. Para seus ex-alunos, claro.
O EXTRA: O que se pôde comemorar nesta data especial para os educadores brasileiros, no último dia 15 de outubro?
ZÉ RENATO: Não há nada para se comemorar no Dia do Professor. Explico: 1-) Especificamente em São Paulo, o Estado mais rico da União, estamos há 3 anos sem nenhum reajuste; 2-) Não há nenhum plano de carreira e nenhuma perspectiva de melhora salarial e profissional; 3-) Salas superlotadas, escassez de material básico, de limpeza, higiene, papel e tinta para impressora, e isso São Paulo sendo o Estado mais rico da União; 4-) Quadro cada vez mais alarmante de violência, no entorno e dentro das escolas, com sucessivos episódios de professores agredidos em sala de aula; 5-) A escola se transformou num depósito de todos os dilemas do apodrecimento de uma sociedade doente; 6-) Já existem notícias de uma nova proposta do governo estadual para o fechamento maciço de salas de aula; 7-) A política de sucateamento da escola pública é corroborada com uma proposta de reforma do Ensino Médio cujo conteúdo o próprio governo federal desconhece, o que se sabe é que ao mesmo tempo em que se fala de aumento da carga horária, criação de ensino integral, fala-se na retirada dos ensinos de Filosofia, Sociologia, História, Geografia, Artes e Educação Física. O poder público tem feito propaganda desta reforma, mas que ainda não existe. Os países que deram um salto qualitativo nos índices internacionais de aferição da qualidade da Educação, centraram seus esforços no 'ensino tradicional' e propedêutico (instrução preparatória, introdução a uma determinada ciência). O caso mais recente é Portugal.
O EXTRA: Está preparado para enfrentar a falta da sala de aula? E quando bater "aquela saudade"?
ZÉ RENATO: Não só pela depressão que tive, a qual me afastou do trabalho por 8 meses, entre os anos de 2010 e 2011, pouco antes de me mudar para Fernandópolis, mas, sobretudo, pela ausência de um fio sequer de esperança por um futuro melhor nesta profissão: não sinto, e nunca sentirei, posso afirmar, falta nenhuma da sala de aula, muito menos do cotidiano escolar. De modo geral, com raríssimas exceções, os estudantes oscilam entre a apatia, o desinteresse e o descompromisso. Me arrependo profundamente de ter escolhido e exercido essa profissão, sobretudo os dois anos que trabalhei no Cáfaro.
O EXTRA: O que fazer para que o ensino público melhore?
ZÉ RENATO: O quadro é extremamente nebuloso e tenebroso. Para verdadeiramente melhor a Educação é necessário: 1-) Profissionais de excelência; 2-) Mas, para isso, é necessário que existam salário e carreira atraentes. De modo geral, o que se vê são profissionais sem, ou com fraquíssima formação, sem disposição para ler e estudar e, por conseguinte, isso se reproduz na falta de qualidade das aulas. Isso tudo mostra a lógica do "faz de conta que paga, finge que trabalha".
O EXTRA: O governo estadual alega falta de recursos para investir na Educação. Você concorda com isso?
ZÉ RENATO: De maneira nenhuma. Não se pode alegar falta de recursos, eles existem, mas são pessimamente aplicados. São, na verdade, desperdiçados. Pessoalmente, entendo isso como proposital, é política de poder, não se quer melhorar. Um detalhe importante: em 2017, o governo estadual fez questão de ignorar completamente o Dia do Professor. Não publicou nenhuma daquelas cartinhas demagógicas ou uma felicitação sequer, e o mais deprimente, essa atitude foi corroborada pelos maiores veículos de comunicação do Brasil: nenhuma menção ao Dia do Professor, muito menos matérias analíticas ou investigativas a respeito do drama cotidiano da sala de aula. Pessoalmente, enviei uma mensagem ao Ombusdman (encarregado de ouvir queixas dos clientes) do jornal Folha de S.Paulo cobrando a omissão. Na resposta, concordou com a minha reclamação, enfatizando a necessidade permanente da Educação Pública como pauta, além do drama dos professores. PS.: A única ponta de orgulho que sinto é por ter conseguido, em alguns casos acho que sim, que consegui, contribuir de forma positiva na vida de meus alunos.
“Tchau e bença”