ESPECIAL DIA DA
O sonho de vestir uma farda
O sonho de vestir uma farda
Conciliando salto e maquiagem com armas e crimes: entrevista especial da semana traz um pouco do dia a dia da PM fernandopolense Rosana Miyuki Higashi Camilo
Conciliando salto e maquiagem com armas e crimes: entrevista especial da semana traz um pouco do dia a dia da PM fernandopolense Rosana Miyuki Higashi Camilo
Tenente Higashi é policial militar há 15 anos
Por Livia Caldeira
Amar incondicionalmente, poder gerar um filho, ser incomparável, ser frágil e forte ao mesmo tempo, são apenas algumas dentre tantas outras características frequentemente atribuídas às mulheres. Costuma-se dizer também que elas são guerreiras por natureza. Talvez isso explique o fato de que elas estão se destacando em muitas áreas que antes eram dominadas pelo sexo masculino. Uma delas são as carreiras policiais.
Filha de policial, A PM fernandopolense Miyuki Higashi Camilo sempre sonhou em seguir a carreira do pai. “No início, por ser mulher, achava que não deveria nem cogitar este sonho. Cheguei a iniciar a Faculdade de Psicologia na UFMS e fui Professora de Ensino Fundamental, mas no fundo sempre quis seguir o caminho do meu pai”, conta. Após alguns anos, o sonho de vestir uma farda falou mais alto e, em 2003, ela ingressou na Polícia Militar do Estado de São Paulo, no concurso para Soldado PM.
O dia a dia duro não a impede de se maquiar e lembrar o lado feminino por trás da farda. “Usar a farda para mim é um sonho que se realiza todos os dias e eu acho lindo, o que fica melhor ainda com unhas bem feitinhas, cabelo arrumadinho e uma boa maquiagem”. O Dia Internacional da Mulher será celebrado na próxima quinta-feira, 08. Em comemoração à data, e para homenagear todas aquelas que, em busca do proprio sonho, alcançam seu espaço nos mais diferentes cargos e setores da sociedade, a Reportagem de “O Extra.net” traz um pouco da rotina da Tenente Higashi, que falou sobre a representatividade da mulher no meio policial, preconceito de gênero e outros assuntos relacionados. Confira:
O EXTRA: Você acha que a presença das mulheres na corporação ainda é relativamente pequena?
Tenente Higashi: Atualmente na Polícia Militar não há distinção entre homens e mulheres em seus respectivos quadros, essa foi uma mudança significativa de isonomia na Instituição, que está constantemente aprimorando seus processos. Cada vez mais vemos homens e mulheres atuando juntos, integrando os mesmos pelotões nas escolas de formação e nas ruas, e da mesma forma, os concursos para ingresso na PM também contemplam a todos, avaliando o candidato não pelo fato de ser homem ou mulher, mas pelo seu desempenho nos testes, havendo ainda nos testes físicos as devidas adequações, de acordo com fatores biológicos que diferenciam homens e mulheres, por isso acredito que cada vez mais, tanto homens como mulheres que tenham este sonho de ingressar nesta carreira, dependerão somente de sua própria dedicação e bom desempenho, por isso o número de mulheres vocacionadas ao serviço policial militar tende a crescer a cada dia, pois cada vez mais estamos compreendendo a força e a capacidade que temos para desempenharmos papéis fundamentais na sociedade. Muitas mulheres nem sequer imaginam que podem prestar o concurso para a PM, muitas vezes ao me verem nas ruas algumas mulheres me perguntam sobre o concurso e dizem que não sabiam quase nada a respeito, depois que conversam comigo falam que vão se informar e se inscrever.
O EXTRA: Você encontra dificuldades ou ‘’saias justas’’ em sua profissão pelo fato de ser mulher?
Tenente Higashi: Eu sempre sonhei em ser Policial Militar, meu pai trabalhou 30 anos na Instituição e eu sempre tive muito orgulho dele. Na verdade, o fato de ser mulher só me ajuda nesta profissão, pois ninguém melhor do que a mulher para entender as pessoas. Na Polícia Militar encontrei uma maneira de tornar o mundo um lugar melhor, muitas vezes ajudando as pessoas nos momentos em que elas mais precisam. Receber treinamento que me capacita a ajudar as pessoas quando tudo o que elas têm é o 190 e atuar na defesa da vida e da dignidade das pessoas de bem, é algo que pensei que seria muito difícil, mas que tem sido cada dia mais gratificante.
O EXTRA: Na sua opinião, ainda existe preconceito com mulheres em determinadas profissões ou cargos, que são quase exclusivamente exercidos por homens?
Tenente Higashi: Eu acredito muito mais na capacidade das pessoas. Para mim, quando uma pessoa quer muito uma coisa e se empenha, nada pode detê-la. Esta forte determinação em me tornar uma Oficial da Polícia Militar nunca permitiu que nenhum tipo de preconceito acontecesse comigo, acho inclusive que eu mesma, por ser mulher, tenho sempre um forte desejo de sempre me superar, acho que toda mulher é assim né?! Por isso não sou a melhor pessoa para falar de preconceito, pois sempre fui muito persistente em realizar os meus objetivos e sempre tive muito apoio das pessoas ao meu redor.
O EXTRA: É possível conciliar seu lado feminino com a farda?
Tenente Higashi: Sempre!!! Não abro mão disso, ser mulher é uma imensa alegria. Nós temos um coração e um brilho especial, temos instinto humanístico e maternal, e também um elevado senso de justiça e uma força interior imensurável.
O EXTRA: O ‘’preconceito’’ – se é que ele existe de fato – acontece mais dentro do ambiente de trabalho com seus colegas de profissão ou nas ruas com a população em geral?
Tenente Higashi: Posso dizer que no meu caso não há preconceito, nem entre meus colegas de trabalho e nem nas ruas, acredito que tudo é uma questão de postura, quando nos empenhamos no trabalho o reconhecimento vem naturalmente, como mulher sempre fui muito exigente comigo mesma, por isso sempre quis corresponder as minhas próprias expectativas, assim sempre tive respeito dos iguais, superiores e subordinados. Nas ruas tenho o respeito da população e sei lidar com os criminosos, o trabalho policial requer técnica, tirocínio e trabalho em equipe, uma vez havendo isso, o serviço transcorrerá com sucesso.
O EXTRA: O que você acha sobre o movimento feminista? Acredita que ele, atualmente, seja necessário?
Tenente Higashi: Feminismo para mim é ter orgulho de ser mulher e empenhar esforços para nos tornarmos um grande exemplo de mulher em todas as áreas de nossas vidas. Frequentemente vejo mulheres usando o termo feminismo de uma maneira com a qual eu não concordo, como se o fato de ser mulher as atrapalhasse na vida e dificultasse suas realizações, isso para mim está errado. Eu acredito muito na força da mulher e na capacidade de superação que temos, juntando isso à meritocracia, não há razão para duvidar das realizações que já conquistamos e que ainda estamos por conquistar.
O EXTRA: O que você acha sobre o papel da mulher atualmente na sociedade? Elas estão conseguindo conquistar seu espaço?
Tenente Higashi: Já conquistamos. É claro que não podemos generalizar, como em nada nessa vida. Em todos os seguimentos vamos encontrar verdadeiros exemplos de mulheres guerreiras que com muito esforço conquistam seu lugar de destaque, como também encontraremos mulheres que não agem da maneira adequada e que, muitas vezes, podem até mesmo usar o fato de serem mulheres para tentarem conseguir alguma vantagem indevida. O importante é fazermos a escolha certa, é decidirmos que tipo de mulher queremos ser em meio à sociedade e seguir em frente, sem esmorecer. Como mulher, acho importante começarmos pela nossa própria casa, sendo primeiro uma boa filha, irmã, esposa, mãe e depois expandir este brilho feminino para os outros setores de nossa vida, no trabalho, nos estudos, entre amigos, na religião e em tudo mais e, importante salientar, que para os homens isso não é diferente. A sociedade pode ser cada vez melhor através da força e da paixão das mulheres e nós temos um papel fundamental neste país que precisa tanto rever seu valores, sua ética e sua grandeza.
O EXTRA: Na sua opinião, o que tem que mudar para que o Dia da Mulher não precise mais ser celebrado?
Tenente Higashi: Como budista aprendi que toda grande mudança deve se iniciar dentro de cada um de nós, o Dia da Mulher começou a ser celebrado em uma época em que as mulheres não tinham nem mesmo o direito ao voto, muitos anos se passaram e ainda hoje atendo a ocorrências onde as mesmas mulheres que são agredidas por seus companheiros, são aquelas que pagam suas fianças depois que os prendemos, por isso sei que ainda há muito o que ser transformado, mas como eu disse, é preciso que cada mulher faça sua reflexão todos os dias e compreenda o verdadeiro sentido de ser uma grande mulher, lutando para transformar a realidade a sua volta. As questões sociais assim como em tudo neste país são muito importantes, uma mulher para ser plena precisa de estudo, cultura, precisa ser útil à sociedade, precisa ter autonomia, ter valores como a família, valores religiosos e ter sonhos a realizar através de seu próprio esforço, mas o que se vê da grande maioria ainda está bem longe disso, porém, tenho certeza de que quando uma mulher toma uma forte decisão de ser uma grande mulher e deseja alcançar a felicidade plena, desde que ela não esmoreça e empenhe esforços contínuos para isso, independentemente das circunstâncias ela será vitoriosa e feliz.
Ela é casada com o também policial militar,1º Ten PM Ricardo Camilo
“Todos os dias como PM é uma oportunidade de fazer a minha parte como cidadã, a profissão me traz um desenvolvimento humanístico muito grande, me tornando uma pessoa cada vez mais realizada”