Por Josanie Branco
Amar alguém verdadeiramente é aceitar as diferenças, doar-se incondicionalmente. É manter a cada dia um sentimento sem limites, sem barreiras e sem preconceito, mas sim, algo que seja belo e único.
O Amor é mesmo incrível… Quando é verdadeiro, quebra qualquer barreira, supera qualquer preconceito, ele simplesmente acontece. E assim tem sido os últimos meses na vida dos jovens Vinícius Antônio Avelar, 19 anos, e Carla Manttovanni, 20 anos, uma história de amor um pouco diferente, mas mantida pelo respeito mútuo e pelo forte sentimento que há onze meses os uniu. Ele músico, cheio de planos, sonhos e que encanta pela voz, ela, deficiente auditiva que busca oportunidades em meio à sociedade e o preconceito ainda presente nos dias atuais. Em entrevista especial a este “O Extra.net”, o casal conta com detalhes sobre esse ‘encontro de almas’.
EXTRA: Como vocês se conheceram?
VINÍCIUS: Meu primeiro contato com a Carla foi através das redes sociais, começamos a conversar pelo Facebook, éramos amigos de bate-papo e assim fomos nos conhecendo melhor, teclávamos quase todos os dias e ali, sem que a gente percebesse, foi nascendo um sentimento especial. Um dia pedi para que a Carla me enviasse um áudio, foi quando ela me disse que não poderia, pois era deficiente auditiva. Eu já tinha consciência de que ela era aluna da APADAF, pois temos um amigo em comum, mas eu não sabia o grau de deficiência que ela tinha. Dias depois fui convidado por esse mesmo amigo para ir à festa junina da Associação, eu aceitei de imediato, pois sabia que aquela seria a oportunidade de poder conversar pessoalmente com a Carla, estava ansioso para isso.
EXTRA: Como foi esse primeiro encontro? Como vocês se comunicaram?
VINÍCIUS: Confesso que foi meio tenso, eu não conseguia me aproximar dela, tinha muita gente e todos se comunicavam em Libras, todos se entendiam bem e se divertiam. Já eu, não entendia nada, me senti um deficiente ali no meio e percebi o quanto eles eram felizes, apesar da limitação de não serem ouvintes.
Só no final da festa eu consegui sentar ao lado da Carla, eu não sabia como me expressar, então comecei a escrever as mensagens no celular e passava para ela ler, em seguida fomos dançar quadrilha juntos. Depois daquele dia tive a certeza de que aquela bela jovem era especial para mim. Começamos a namorar dias depois e estamos juntos e felizes.
EXTRA: Quando você viu pessoalmente que a Carla era deficiente auditiva e que a comunicação de vocês seria, um tanto quanto, difícil, o que você sentiu?
VINÍCIUS: Para mim nada mudou, eu estava encantando por ela, pela essência dela e nunca vi a limitação como algo que nos atrapalharia. Mas eu sabia que teríamos que arrumar um jeito de nos entendermos, afinal estávamos dispostos a ficar juntos. A princípio eu escrevia, mas sabia que isso era algo provisório, então me dei conta de que a mudança teria que vir de mim. A partir daí comecei a pedir para ela me ensinar Libras, eu queria aprender tudo o mais rápido possível. Nós nos ensinamos a cada dia, aprendemos juntos, eu a língua dela e ela a nossa, aos poucos vou ensinando novas palavras para a Carla.
EXTRA: Foi muito difícil você se adaptar a esse novo aprendizado que hoje faz parte do seu dia a dia?
VINÍCIUS: Não, para mim foi algo natural, sou muito tranquilo e estou bem certo do que quero, pela Carla vale a pena. Com toda essa mudança na minha vida cheguei a conclusão de que todos deveriam aprender línguas como a Libra e o Braille. A sociedade deveria se adaptar para atrair o deficiente e não constrangê-lo com atitudes preconceituosas.
EXTRA: Na sua visão esse preconceito é latente nas pessoas?
VINÍCIUS: Sim, até mesmo na família de muitos deficientes há preconceito. Hoje sinto de perto essa triste realidade, muito seres humanos se acham superiores só porque aparentemente tem uma vida normal, esses são os verdadeiros deficientes, aqueles que não conseguem reconhecer uma pessoa pelo que ela de fato é. A Carla é inteligentíssima, dedicada e cheia de planos, a única diferença é que ela se comunica com as mãos e não com os lábios, isso não a torna inferior a ninguém, mas sim muito especial.
EXTRA: Como é o convívio da Carla com a sociedade?
VINÍCIUS: Como já citei, na minha visão a sociedade deveria se adaptar às pessoas deficientes. É difícil para a Carla se comunicar, por exemplo em uma loja, banco, unidades de saúde e muitos outros locais. As pessoas não entendem sua linguagem e isso é constrangedor para ambos os lados. Por isso ela costuma ir sempre nos mesmos lugares, onde as pessoas já a conhecem. Da mesma maneira há uma grande dificuldade para se ingressar no mercado de trabalho, ela teve de largar a faculdade, pois não tinha condições de manter as despesas do curso e também não consegue arrumar um serviço, as pessoas sempre a dispensam na hora da entrevista, por ela ser surda. Isso é muito triste, mas real.
EXTRA: Você faz parte de uma dupla sertaneja: Ander e Avelar. Como a Carla acompanha seu trabalho?
VINÍCIUS: Sempre que posso levo a Carla comigo, muitas vezes tento cantar em Libras para ela, mas também estou em aprendizagem da língua de sinais e não é tudo que sei falar com rapidez e clareza. Quando componho também mostro as letras para ela e assim vamos nos entendendo bem, nos completando dia a dia.
EXTRA: Depois que você e a Carla começaram a namorar, o que mudou em sua maneira de pensar?
VINÍCIUS: Muita coisa, hoje sou uma pessoa muito mais responsável, pois de certa forma tenho responsabilidades sob a Carla. Tornei-me mais humano, menos egoísta e muito mais feliz. Meus planos são de trabalhar bastante, honestamente, e dar um futuro para ela, quero, assim que puder, pagar a faculdade para ela e creio que vou conseguir.
Meus pais também estão aprendendo Libras para poder se comunicar melhor com ela, isso para mim é muito importante.
EXTRA: Carla, para você as pessoas aceitam e respeitam os deficientes?
CARLA: Não ligo para o que as pessoas pensam e nem para o preconceito que muitos têm, sinto-me feliz e isso é o que importa. Muita gente fica olhando para a gente quando estamos nos comunicando, mas não ligo, acho natural. A única coisa que me entristece é a falta de oportunidade para trabalhar e desta forma não poder dar seguimento nos meus estudos, isso de fato me deixa magoada.
EXTRA: Sua deficiência é congênita ou adquirida?
CARLA: Nasci ouvinte, mas minha mãe é deficiente auditiva, quando eu tinha um ano e meio tive uma febre muito alta, mais de 40 graus e comecei a delirar, a partir desse dia não mais ouvi, com minha mãe foi exatamente igual. Desde pequena frequento a ADAPAF (Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos), tudo o que aprendi e toda minha socialização e meus amigos foram conquistados ali, sou muito grata à Associação.
EXTRA: Resumindo em poucas palavras, o que vocês representam um na vida do outro?
CARLA: O Vinícius é um amigo, companheiro, que tem me ajudado muito. Fico feliz que esteja aprendendo Libras e que ele me aceita exatamente como sou. Quero viver toda minha vida ao lado dele, futuramente casarmos e constituirmos uma família feliz, quero envelhecer com ele.
VINÍCIUS: A Carla foi um verdadeiro presente para minha vida. Hoje sei que quando há sentimentos, não existem diferenças, pois o que a torna diferente para muitos, para mim a torna especial.