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Vinicius de Moraes “vence” ditadura também nos tribunais: “artista não é vagabundo”

Vinicius de Moraes “vence” ditadura também nos tribunais: “artista não é vagabundo”

Aposentadoria compulsória veio com o AI-5, em 1969: “Demita-se esse vagabundo”, ordenou Costa e Silva, via memorando

Aposentadoria compulsória veio com o AI-5, em 1969: “Demita-se esse vagabundo”, ordenou Costa e Silva, via memorando

Publicada há 3 anos

Acordo garante indenização de R$ 3,4 milhões a serem pagos por precatório à família do “poetinha” - Foto: Arquivo

Da Redação

Após mais de 20 anos tramitando na Justiça, chegou ao fim o processo de indenização movido por três herdeiras de Vinicius de Moraes (1913-1980) contra a União, por danos morais e materiais decorrentes da perseguição sofrida durante a ditadura militar. 

No acordo feito na 28ª Vara Federal no Rio de Janeiro, A União se comprometeu a indenizar as herdeiras em R$ 3,4 milhões, por conta da aposentadoria compulsória submetida ao poeta e então diplomata, após o AI-5 (Ato Institucional nº 5) ser decretado pela ditadura militar, em dezembro de 1968.

O processo foi ajuizado em 1994 e tem como autoras Luciana de Moraes (1956-2011), Georgiana de Moraes e Maria Gurjão de Moraes, três dos cinco filhos de Vinicius (os outros são o fotógrafo Pedro de Moraes e a cineasta Suzana de Moraes, que morreu em 2015, em decorrência de um câncer).

Na ação, foi requerida a promoção de Vinicius ao cargo de ministro de primeira classe. A progressão foi calculada com base no posto alcançado por colegas que ingressaram na diplomacia na mesma época que o poeta e que continuaram na ativa. Em abril de 1969, ele foi aposentado como primeiro secretário.

A decisão é definitiva, já que não há mais possibilidade de recursos por parte da União. O pagamento será feito de forma integral, por precatório (documento que reconhece uma dívida judicial do governo, depois de o processo ser transitado em julgado).

“O acordo leva em conta, além da diferença entre os níveis da carreira que Vinicius foi impedido de atingir, os danos morais, como os prejuízos a sua imagem, questões que não são puramente de ordem material”, explica Carlos Augusto Guilhermino Veiga, um dos advogados que representam a família. 

Sem data definida, o pagamento será realizado de acordo com o orçamento do governo federal nos próximos anos.

A MEDIOCRIDADE DE UM DITADOR

O relatório da Comissão da Verdade, instituída em 2011 para desenterrar as violações ocorridas na ditadura, revelou que a Comissão de Investigação Sumária, criada em 1969, forçou a aposentadoria de Vinicius de Moraes por motivo de “embriaguez” e “boemia”. 

Ruy Castro, em seu livro “Chega de saudade” (1990), tornou público que o então presidente Artur da Costa e Silva enviou um memorando ao ministro das Relações Exteriores da época, Magalhães Pinto, com a seguinte ordem: “Assunto: Vinicius de Moraes. Demita-se esse vagabundo”.

Vinicius morreu em 9 de julho de 1980, em decorrência de um edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, ao lado de sua última mulher, Gilda Mattoso.

ARTISTA GENIAL

São dele músicas memoráveis, como “Garota de Ipanema”, que virou filme e está eternizada por vozes das mais variadas vertentes, como Frank Sinatra, Madonna, Amy Winehouse, Andrea Bocelli, Ella Fitzgerald, Kenny G e até os Muppets, com direito a samba nos pés, pero no mucho, de Petula Clark, em uma adaptação para o que se tornou “The Boy from Ipanema”. 

Sua peça “Orfeu da Conceição” foi premiada em 1954 no concurso de teatro do IV Centenário de São Paulo.

Em agosto de 1962, ao lado de João Gilberto, Tom Jobim e ‘Os Cariocas’, apresentou-se em ‘Encontro’, show de lançamento de “Garota de Ipanema”, “Só danço samba”, “Insensatez”, “Ela é carioca” e “Samba do avião”.

De sua parceria com outro gênio da música, Toquinho, surgiram “Tarde em ltapuã”, “Como dizia o poeta”, “Maria-vai-com-as-outras”, “Testamento” e “Regra três”.

Ao lado de Toquinho e Clara Nunes encantou Salvador em 1973, no show “O poeta, a moça e o violão”, no Teatro Castro Alves. 

Outro importante parceiro foi Carlos Lyra, que conheceu em l961, ano em que fizeram juntos os sambas-canções “Você e eu”, “Coisa mais linda”, “Primeira namorada”, “Nada como ter amor”, entre outras. Em 1962, em parceria com Pixinguinha, fez a trilha sonora do filme “Sol sobre a lama”, de Alex Viany. Também para esse filme, colocou letra em “Lamento”.

Publicou livro de crônicas e poemas, “Para viver um grande amor” e, ainda em 1962, conheceu Baden Powell. Juntos, compuseram grandes sucessos como “Samba da bênção”, “Só por amor”, “Canção de amor e paz”, “Pra que chorar”, “Deixa”, “Tem dó”, “Tempo feliz”, “Formosa”, “Apelo”, “Samba em prelúdio”, “Consolação” e “Berimbau”.

Lançaram juntos uma série de afro-sambas, entre os quais “Canto de Ossanha”, “Canto de Xangô”, “Canto de Iemanjá”, “Bocoxé” e “Samba de Oxóssi”. Compôs, ainda com Carlos Lyra, “A Marcha da Quarta-feira de Cinzas” e as músicas para sua peça “Pobre menina rica”, entre as quais “Minha namorada”.

Gilda Mattoso possui, entre algumas raridades do artista, uma carta enviada a Vinicius por Charles Chaplin. Os gênios se entendem.


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http://www.mpbnet.com.br/musicos/vinicius.de.moraes/


Fonte: O Globo e MPBNET

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