Pokémon também tem pai e, como todo pai, ele poderia estar chateado por ouvir as pessoas falando mal de sua criação. No entanto, se tem gente criticando, há outros milhares de caçadores divertindo-se com os monstrinhos e dando muito lucro ao progenitor. A franquia Pokémon, abreviação de Pocket Monsters [Poketto Monsutã] – na pronúncia japonesa - cuja tradução literal significa Monstros de Bolso, foram criados no Japão por Satoshi Tajiri.
Sua biografia conta que mãe o proibia de ter animais de estimação, então saía pelas florestas em busca de insetos para colecionar. Por isso, quando adulto, criou os famosos personagens para mostrar às crianças como é caçar insetos. Já o Pokémon Go, aplicativo para celulares que se utiliza da Realidade Aumentada, tecnologia que permite a integração entre o mundo real e o virtual, tem como pai o americano John Hanke. Apesar do sucesso recente do jogo, o Pokemon Go não surgiu de uma hora para outra. Há mais de vinte anos Hanke vem trabalhando nesse projeto. No ano de 2000 ele lançou um aplicativo chamado Keyhole, que unia mapas com imagens aéreas, criando o primeiro GPS de visão aérea online do mundo, o qual foi comprado pela Google e deu origem ao programa Google Earth.
Ele também foi responsável pela criação do Google Maps e do Google Street View. Posteriormente, Hanke criou a empresa Niantic Labs – fundada pela Google para desenvolver jogos baseados em mapas, responsável pela criação do jogo Ingress, antecessor do Pokémon Go, que só surgiu mesmo a partir de uma brincadeira, em 1º de abril de 2014, numa parceria realizada entre a Google e The Pokémon Company, na qual os usuários podiam encontrar Pokémon dentro do Google Maps. A brincadeira viralizou e tornou-se um sucesso, dando a ideia a Hanke de transforma-la em um jogo de verdade. Nascia, assim, o Pokémon Go.
O Pokémon Go não é apenas mais um jogo. Além de uma criação que soma inteligência, esforço e tecnologia, é uma grande e bem bolada campanha de marketing e também um produto, hoje, de propriedade da Google, Nintendo, The Pokémon Company e outros investidores, cujo sucesso fez as ações da Nintendo dispararem na Bolsa, aumentando o valor da companhia em mais de 12 bilhões de dólares, tornando-se, ainda, o jogo mais lucrativo da história, com receita superior a 2 milhões de dólares por dia em compras efetuadas dentro do aplicativo. Deixando de lado o capitalismo, pois existem outros projetos e ações para que o Pokémon Go possa gerar mais lucro, ele é apenas um jogo, como todos os outros criados para divertir e propiciar lazer.
Por isso acho uma grande besteira toda a polêmica que as pessoas criam em torno disso. Com relação ao aspecto alienador do jogo, se é que existe, me parece mínimo diante de tantas outras coisas alienadoras de maior relevância infiltradas em nossa sociedade, seja na indústria cultural, de entretenimento ou mesmo de brinquedos infantis.
A alienação no mundo social começa bem cedo, na própria família, quando, especialmente, as mães fazem as meninas acreditarem que são ou poderão ser princesas. Fazem-nas crescer com a inconsciente e frustrante expectativa de que, se são princesas, encontrarão um príncipe encantado montado em seu cavalo. E sabemos que príncipe encantado só existe em contos de fada e desenhos da Disney. O máximo que essas meninas poderão encontrar, quando mulheres, é um homem normal, quando não um sapo, ou apenas o cavalo.
Karl Marx já dizia que, no mundo capitalista, os indivíduos já estão alienados: são alienados pelo trabalho, pelo consumo, pela hierarquia das relações. Somos alienados a partir do momento em que não temos o conhecimento de todo o social, apenas fragmentos sociais, apenas aquilo que nos é lícito saber. Outro ponto é a demonização do jogo por alguns segmentos religiosos. Como de costume, ficam procurando os demônios para apoderarem-se do medo como arma de arrebanhamento de pessoas. Esquecem-se de caçar os verdadeiros demônios existente dentro e fora da Igreja. O demônio da desonestidade, do narcisismo, do fanatismo, da indiferença, da ganância, da traição, da maledicência, da intolerância e do fanatismo exacerbado. Também ouço vozes bradando sobre o idiotismo que o jogo pode causar. Outra grande besteira propagada pelos apocalípticos de plantão, ignorantes da própria ignorância, amantes da hecatombe como instrumento de aniquilação honrosa da imbecilidade privativa. Com exceção dos já idiotas que atravessam a rua olhando tão somente para a tela do celular e são atropelados, ninguém mais vai ser punido por Odin ou pela ira de Deus. Pode-se falar na futilidade da brincadeira.
Ela realmente existe, como existe na essência de tantos outros jogos. Existe coisa mais besta que o golfe: passar horas tentando encaixar uma bolinha dentro de um buraco? Não é essa a essência desse jogo? E para os saudosistas na janela, tenho outra. O Bilboquê, brinquedo do tempo em que a lamparina dava choque, que consiste em uma esfera de madeira com um orifício central, presa por um cordão em um suporte de madeira, no qual o jogador, através do movimento das mãos, precisa fazer encaixar a bola de madeira. Êta coisa besta. Porém, assim como o Pokémon Go, a maioria dos jogos cumprem seu papel de fazer passar o tempo e divertir os jogadores, conseguindo atenção e sucesso à medida que são capazes de suscitar um estímulo básico: o desafio. Isso é o que move as pessoas a entrarem na disputa. Como todos nós gostamos de brincar, em razão das crianças de diferentes idades que habitam nossas mentes, e, como seres humanos, quase nunca fugimos quando desafiados, esse ou outros jogos continuarão a surgir e a virar modismo. Seja como for, o Pokémon Go é apenas um jogo, enquanto serve para divertir. Pode ser um produto, uma marca, mas não um monstro real. É virtual. E cabe no bolso de quem, de vez em quando, precisa brincar para fazer a vida passar.